As novas sanções dos Estados Unidos contra a família de Alexandre de Moraes fizeram o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), ligado ao ministro, prolongar o calendário previsto para aprovação do projeto da anistia – agora rebatizado de PL da Dosimetria – para os condenados do 8 de janeiro de 2023.
O parlamentar repete que faz interlocução com ministros do Supremo para que a proposta não fosse seja barrada na Corte nem rejeitada no Senado.
Ao menos três líderes partidários confirmaram à reportagem que as novas sanções dos EUA terão impacto direto no acordo que vinha sendo costurado para aprovar uma revisão das penas. “Todo acordo que estava sendo costurado vai precisar ser revisto”, disse o próprio Paulinho da Força. “Acho que essa interferência dos americanos na Justiça brasileira é indesejada. Tem gente que continua fazendo esse papel e vamos ter que repensar tudo que vinha sendo construído”, afirmou ainda o deputado.
Nesta segunda-feira (22), o governo Donald Trump anunciou a inclusão da mulher do magistrado, a advogada Viviane Barci de Moraes, na lista de sancionados pela Lei Magnitsky. Também são alvos das restrições financeiras o escritório administrado por Viviane e uma empresa dela e dos três filhos, a Lex Instituto de Estudos Jurídicos, que é dona de imóveis da família avaliados em mais de R$ 20 milhões.
Líderes partidários admitem nos bastidores que integrantes do STF fizeram chegar a Hugo Motta preocupação com o avanço do texto da anistia diante das novas sanções por parte dos EUA. Assessores do presidente da Câmara avaliam que pautar o texto agora poderia significar um enfrentamento que a Casa deseja evitar contra o Supremo.
Com isso, o relator da anistia já sinalizou que a proposta pode ficar travada na Casa por tempo indeterminado. A expectativa é de que o tema seja discutido na reunião de líderes da próxima semana, mas sem a perspectiva de ser colocado para votação.
O relator do projeto da anistia é próximo de Alexandre de Moraes e mantém interlocução com outros ministros da Corte, como Gilmar Mendes e Flávio Dino, por exemplo. “Estou ouvindo os partidos e vamos ver o que eles falam. Se tiver entendimento, pode [acontecer] todo tipo de coisa. Se tiver algum ruído [com o Supremo], a gente pode deixar para outra semana a votação”, disse Paulinho da Força.
Oposição reage contra interferência do STF na agenda do Legislativo
O movimento de ministros do STF provocou uma reação por parte dos integrantes da oposição, que acusam a Corte de interferir na agenda do Legislativo.
“Ficou claro que há uma interferência do Poder Judiciário na competência do Congresso Nacional. O próprio deputado Paulinho da Força disse que a anistia não será votada nesta semana, porque ‘não há clima’ após as sanções aplicadas à esposa do ministro Alexandre de Moraes. Isso é uma interferência direta na atividade legislativa. É um absurdo, é abjeto que ministros do Supremo digam o que deve ou não ser pautado”, disse Caroline de Toni (PL-SC), líder da Minoria na Câmara.
A irritação dentro do STF com a extensão da Lei Magnitsky à mulher e aos filhos de Moraes ainda pressionou o presidente da Câmara, Hugo Motta, a derrubar a nomeação do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), principal articulador das sanções, da liderança da Minoria, posto que daria a ele a possibilidade de manter o mandato à distância.
O PL, partido de Jair Bolsonaro, havia escolhido o parlamentar para o posto, ocupado atualmente por Caroline de Toni, a fim de salvar o seu mandato – pelas regras do regimento, a ausência de líderes nas sessões não levam à cassação.
“Depois da Magnitsky contra a esposa e o escritório do ministro Alexandre de Moraes, eu recebi uma ligação do presidente Hugo Motta, falando que ele não poderia mais cumprir comigo o compromisso. Ele disse que o tom ficou muito acima da média, ou seja, ele não me afirmou, mas eu entendi que foi por retaliação ao que aconteceu com a família do ministro Alexandre de Moraes”, disse o deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), líder do PL na Câmara.
Eduardo Bolsonaro já acumulou pelo menos 23 faltas não justificadas (62,16% das sessões) em 2025 e pode perder o mandato por ultrapassar o limite de ausências permitidas (1/3 das sessões) sem justificativa.
O deputado está nos Estados Unidos desde fevereiro e, nesta terça-feira (23), o Conselho de Ética da Câmara abriu um processo que pode levar à cassação do deputado por condutas incompatíveis com o mandato parlamentar.
“Nós entendemos que essa é mais uma tentativa de punição, perseguição e de censura à oposição desta Casa. Nos causa realmente espanto que, um dia depois da sanção aplicada à esposa do Alexandre de Moraes, venha esse tipo de pressão externa à Câmara dos Deputados, fazendo com que o presidente Hugo Motta faça esse indeferimento. Não podemos aceitar esse tipo de violação às nossas prerrogativas parlamentares”, disse Caroline de Toni.
Na véspera do indeferimento da indicação feita pelo PL, o ministro Alexandre de Moraes mandou que o presidente da Câmara fosse oficiado da denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Eduardo Bolsonaro.
No entendimento do procurador-geral, Paulo Gonet, a Casa pode adotar medidas disciplinares contra o deputado.
Ministros pressionam Congresso em outras frentes
Além da pressão contra a anistia e pela cassação de Eduardo Bolsonaro, os ministros do STF têm agido em outras frentes na rusga com o Congresso.
Na semana passada, Gilmar Mendes acelerou a tramitação de duas ações no STF que buscam dificultar o impeachment de ministros da Corte. Uma foi proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) e a outra pelo Solidariedade — partido comandado por Paulinho da Força.
Ainda na semana passada, Flávio Dino rejeitou um recurso contra a cassação do mandato de Chiquinho Brazão, acusado de ser o mandante da morte da vereadora Marielle Franco, dizendo que ausências, ainda que justificadas por prisão preventiva, permitem perda do mandato. Embora não relacionada a Eduardo, a decisão foi vista por deputados como uma indireta: Dino destacou que a função de representação popular é incompatível com a ausência prolongada do território nacional.
Fora isso, Dino controla com mão de ferro, do STF, a liberação de emendas parlamentares do Executivo para o Legislativo. O ministro conduz ações que exigem transparência e rastreabilidade dos recursos.
Ele já pediu manifestações da AGU (Advocacia-Geral da União) e a PGR (Procuradoria-Geral da República) sobre as emendas “Pix” e as impositivas. O primeiro tipo injeta dinheiro diretamente no caixa das Prefeituras e o segundo obriga o governo a transferir os recursos. As ações incomodam o Legislativo não apenas por dosar a liberação dos recursos, mas por levar à abertura de inquéritos sigilosos para investigar desvios.
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