Análise técnica e documental — Ronaldo Cunha / Jornal de Meriti
INTRODUÇÃO
O ano de 2025 ficará marcado na história recente de São João de Meriti como o período em que a calamidade financeira deixou de ser uma medida emergencial e passou a se tornar o padrão de gestão do município.
O presente dossiê é uma análise técnica detalhada, elaborada com base em documentos oficiais, e tem como objetivo reconstruir a linha dos fatos, expor as inconsistências contábeis e sinalizar as violações fiscais e administrativas que, pela natureza e gravidade, demandam intervenção do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ).
Entre janeiro e setembro de 2025, a Prefeitura de São João de Meriti editou três decretos de calamidade financeira consecutivos. Cada um deles prorrogou o estado de exceção por 120 dias, totalizando nove meses de vigência ininterrupta.
O resultado é alarmante: uma dívida que começou em R$ 400 milhões saltou para R$ 1,04 bilhão — sem memória de cálculo, sem plano fiscal, sem metas de recuperação e sem relatórios públicos compatíveis com a gravidade alegada.
O que se observa é a institucionalização do caos financeiro, usada como instrumento político e administrativo, em flagrante violação à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
CAPÍTULO I — O INÍCIO DA CRISE (DECRETO Nº 7.337, DE 10 DE JANEIRO DE 2025)
O Decreto nº 7.337, publicado em 10 de janeiro de 2025, inaugura oficialmente o estado de calamidade financeira no município.
O documento, de quatro artigos, declara a crise e lista medidas emergenciais de contenção.
1.1 Estrutura do decreto
O texto é composto por uma sequência de “considerandos”, seguidos de medidas administrativas diretas:
- Considerando o déficit financeiro superior a R$ 400 milhões, apontado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ);
- Considerando o atraso no pagamento de servidores e o risco de paralisação de serviços essenciais;
- Considerando a queda de arrecadação do ICMS e o bloqueio de repasses federais;
- Considerando o comprometimento do sistema de saúde, da coleta de lixo e da previdência municipal.
Com base nesses fundamentos, o prefeito decreta a calamidade pública financeira e estabelece medidas imediatas:
- Corte de até 30% em contratos administrativos,
- Redução de até 20% na folha de pagamento (exceto serviços essenciais),
- Suspensão do Carnaval 2025,
- Revisão de programas e aluguéis,
- E ações emergenciais na coleta de lixo e limpeza urbana.
A vigência foi fixada em 120 dias, encerrando-se em 09 de maio de 2025.
1.2 Problemas identificados
Apesar da gravidade descrita, o decreto falha nos princípios básicos da transparência fiscal:
- Ausência total de memória de cálculo: não há anexo técnico ou planilha que explique a origem dos R$ 400 milhões.
- Inexistência de plano de ajuste fiscal: nenhuma meta, cronograma ou projeção de recuperação.
- Falta de metodologia contábil: o decreto não informa se o valor corresponde à dívida consolidada líquida (DCL), restos a pagar, precatórios ou passivos previdenciários.
- Medidas vagas: cortes “até X%” sem indicar o impacto real no orçamento.
- Violação da LRF (art. 48 e 65): ausência de publicidade dos relatórios fiscais obrigatórios (RREO, RGF e DCL).
Em termos técnicos, o decreto declarou o caos, mas não apresentou prova do caos.
CAPÍTULO II — A EXPANSÃO DO ROMBO (DECRETO Nº 7.406, DE 08 DE MAIO DE 2025)
O Decreto nº 7.406, publicado em 08 de maio de 2025, renova a calamidade por mais 120 dias.
Desta vez, o texto menciona um dado novo — e preocupante: o passivo municipal teria saltado para R$ 1,04 bilhão, representando um aumento de 160% em apenas quatro meses.
2.1 O que diz o texto
A ementa confirma:
“Prorroga, por mais 120 dias, o estado de calamidade pública no âmbito da administração financeira do Município.”
Os “considerandos” repetem a retórica anterior, mas inserem um novo argumento:
“Considerando a reavaliação do déficit orçamentário-financeiro, superior a R$ 1.040.000.000,00, conforme apontamentos do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.”
Apesar da menção à reavaliação, não há qualquer anexo contábil que mostre como o déficit foi recalculado.
O texto apenas renova a vigência e reafirma o uso das medidas anteriores.
2.2 Problemas identificados
- Sem comprovação da nova dívida: o decreto atualiza o valor, mas não mostra as contas.
- Sem relatório de execução: não há comparação entre janeiro e maio; nenhum resultado do primeiro ciclo (o que melhorou? o que piorou?).
- Sem metas intermediárias: o decreto apenas prorroga, sem indicar objetivos mensuráveis.
- Sem contrapesos de controle: nenhuma previsão de auditoria, comitê de acompanhamento ou divulgação de relatórios periódicos.
2.3 Efeito prático
A prorrogação transforma a exceção em rotina.
Em vez de um plano fiscal, Meriti ganha mais 120 dias de calamidade com o dobro da dívida e zero explicação.
O artigo 65 da LRF é novamente violado: a calamidade deve ser temporária, comprovada e acompanhada de relatórios técnicos — e não repetida indefinidamente como justificativa política.
CAPÍTULO III — A CONSOLIDAÇÃO DO COLAPSO (DECRETO Nº 7.462, DE 05 DE SETEMBRO DE 2025)
Em 5 de setembro de 2025, o Decreto nº 7.462 renova pela segunda vez o estado de calamidade financeira.
A redação é praticamente idêntica à anterior — uma repetição literal do texto de maio.
Nenhum número novo é apresentado. O valor de R$ 1,04 bilhão é mantido, sem explicações adicionais.
3.1 Estrutura textual
“Prorroga, por mais 120 dias, o estado de calamidade pública estabelecido pelos Decretos nº 7.337 e nº 7.406.”
A justificativa é a mesma:
“Considerando a persistência do desequilíbrio orçamentário-financeiro e o déficit superior a R$ 1.040.000.000,00.”
Não há menção a metas cumpridas, reduções de despesa, renegociação de contratos ou aumento de receita.
3.2 Problemas identificados
- Texto idêntico: repete, palavra por palavra, os fundamentos anteriores, sem nenhuma evolução técnica.
- Ausência de avaliação do ciclo anterior: não há relatório da gestão dos recursos entre maio e setembro.
- Nenhuma publicação contábil correlata: o portal da transparência não registra RREO/RGF que sustentem o déficit informado.
- Calamidade como modelo de gestão: o decreto já não declara emergência — ele mantém a exceção como regra.
3.3 Vigência
O decreto tem validade de 120 dias, encerrando-se em 3 de janeiro de 2026.
Se não for revogado, o município entrará em 2026 com um ano inteiro de calamidade fiscal ininterrupta.
CAPÍTULO IV — ANÁLISE GERAL E PADRÕES DE IRREGULARIDADE
Após a leitura integral dos três decretos, é possível identificar um padrão recorrente de ilegalidade técnica e negligência fiscal:
1️⃣ Ausência de comprovação técnica contínua (art. 65, LRF):
Nenhum decreto foi acompanhado de relatório, parecer técnico ou auditoria que comprove a existência real da calamidade.
O salto de R$ 400 milhões para R$ 1,04 bilhão não possui memória de cálculo, metodologia, nem origem identificável.
2️⃣ Transparência fiscal insuficiente (art. 48, LRF):
Os decretos não indicam onde estão publicados os relatórios oficiais, o que viola o princípio da publicidade fiscal e dificulta o controle social.
3️⃣ Ausência de metas, prazos e responsáveis:
Não há metas mensuráveis (redução de passivo, aumento de receita, etc.), prazos intermediários nem autoridades responsáveis por cumprir o ajuste.
4️⃣ Desvirtuamento da excepcionalidade:
O regime de calamidade, previsto na LRF para situações temporárias e imprevisíveis, virou mecanismo de prorrogação política da má gestão.
5️⃣ Possível omissão de controle externo:
A continuidade de decretos idênticos sem reação formal do TCE-RJ indica falha de fiscalização, cabendo ao MP solicitar auditoria judicial e esclarecimento do Tribunal.
CAPÍTULO V — CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÃO AO MINISTÉRIO PÚBLICO
O conjunto probatório é claro:
há indícios concretos de violação à Lei de Responsabilidade Fiscal, gestão temerária, omissão de controle externo e dano continuado ao erário.
O Jornal de Meriti recomenda que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro:
1️⃣ Instaure Inquérito Civil Público (ICP) para apurar as irregularidades nos Decretos nº 7.337, 7.406 e 7.462;
2️⃣ Requisite à Prefeitura as planilhas completas da DCL (jan, mai e set/2025), com metodologia contábil aplicada;
3️⃣ Determine a entrega dos RREO e RGF de 2025 e balancetes mensais;
4️⃣ Solicite ao TCE-RJ informações sobre auditorias, pareceres e alertas fiscais emitidos sobre os decretos;
5️⃣ Avalie a necessidade de ação civil pública ou medidas cautelares, conforme o resultado da apuração.
GUIA COMPLETO — COMO PROTOCOLAR SUA DENÚNCIA NO MP-RJ
PASSO 1 — ACESSE O PORTAL OFICIAL
🔗 https://www.mprj.mp.br/ouvidoria
Clique em “Denúncia”.
Você pode escolher “anônima” ou “identificada” (o MP garante sigilo total).
PASSO 2 — ESCREVA SUA DENÚNCIA
Use o modelo abaixo, adaptando se desejar:
“Em 2025, a Prefeitura de São João de Meriti publicou três decretos consecutivos de calamidade financeira: nº 7.337 (10/01), nº 7.406 (08/05) e nº 7.462 (05/09).
O passivo municipal saltou de R$ 400 milhões para R$ 1,04 bilhão, sem plano de ajuste fiscal, metas ou relatórios contábeis públicos, em possível violação à Lei de Responsabilidade Fiscal (arts. 48 e 65).
Solicito ao Ministério Público que instaure Inquérito Civil Público para investigar as irregularidades, requisitar documentos ao TCE-RJ e à Prefeitura, e determinar medidas de transparência.
Links oficiais dos decretos estão anexados abaixo.”
PASSO 3 — ANEXE OS DOCUMENTOS (ou cole os links)
📎 Decreto nº 7.337 (10/01/2025):
https://drive.google.com/file/d/1rqiOCHVBPYj9lSQvcidwJgXoknYnXUWP/view?usp=drivesdk
📎 Decreto nº 7.406 (08/05/2025):
https://drive.google.com/file/d/1mdGLTb63oCKvZjYph8UJPAZV7z0qFkIu/view?usp=drivesdk
📎 Decreto nº 7.462 (05/09/2025):
https://drive.google.com/file/d/1pOIq-SqovEm1PuUH91VYhZA1eAn1YdKr/view?usp=drivesdk
PASSO 4 — ENVIE E GUARDE O PROTOCOLO
O MP-RJ gerará um número de protocolo.
Esse número é sua comprovação de denúncia e serve para acompanhamento posterior.
PASSO 5 — ACOMPANHE (OPCIONAL)
Caso tenha se identificado, você poderá acompanhar o andamento pelo próprio portal.
Se for denúncia anônima, basta guardar o número para futura consulta.
PASSO 6 — CÓPIA PARA OUTROS ÓRGÃOS (OPCIONAL)
Envie cópia do texto e dos links para:
- TCE-RJ: ouvidoria@tce.rj.gov.br
- ALERJ: ouvidoria@alerj.rj.gov.br
NOTA FINAL
Este dossiê não é um documento político.
É um instrumento técnico e cívico, construído com base em documentos públicos, com o propósito de garantir à sociedade o direito constitucional à transparência e ao controle social das contas públicas.
Eu, Ronaldo Cunha, profissional de Tecnologia da Informação, com experiência em documentação e análise pública, coloco-me à disposição para auxiliar qualquer morador que deseje registrar sua própria denúncia de forma segura, técnica e embasada.
📞 (21) 97914-2431
📢 @jornaldemeriti
ATUALIZAÇÃO ÀS 11:22 SEXTA-FEIRA 17/10
PASSO A PASSO PARA DENUNCIAR AO MPRJ
- Acesse o site da Ouvidoria do MPRJ:
https://www.mprj.mp.br/comunicacao/ouvidoria/formulario - Clique em “Fazer Comunicação” e escolha o tipo “Sugestão”.
- No campo “Relato”, escreva de forma simples e direta.
Exemplo de texto: “Em 2025, a Prefeitura de São João de Meriti publicou três decretos de calamidade financeira — 7.337 (10 de janeiro), 7.406 (8 de maio) e 7.462 (5 de setembro) — elevando a dívida de R$ 400 milhões para R$ 1,04 bilhão, sem plano de ajuste, metas ou relatórios públicos. Solicito que o Ministério Público investigue possível violação à Lei de Responsabilidade Fiscal e falta de transparência.” - Escolha a forma de identificação:
- “Quero me identificar”;
- “Quero me identificar, mas com sigilo”; ou
- “Quero fazer o meu relato permanecendo anônimo.”
- Leia e aceite os termos, depois clique em “Enviar.”
- Guarde o protocolo e a senha que aparecerão na tela.
Eles são o comprovante da sua denúncia e permitem acompanhar o andamento pelo site. - (Opcional) Se informou e-mail, confirme a mensagem enviada pelo MPRJ para validar e receber atualizações.