A Justiça Eleitoral declarou, nesta segunda-feira (27/05), a inelegibilidade por oito anos do ex-prefeito João Ferreira Neto (Dr. João), do deputado estadual Valdecy da Saúde e do deputado federal Carlos Roberto Rodrigues (Bebeto). A decisão atende a uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) movida pelo Ministério Público Eleitoral (MPE), por meio da 88ª Promotoria Eleitoral, e reconhece a prática de abuso de poder político e econômico nas eleições de 2024, em São João de Meriti.
Segundo a sentença da juíza Renata Travassos Medina, da 88ª Zona Eleitoral, o grupo utilizou a estrutura administrativa da Prefeitura para beneficiar politicamente a campanha de Valdecy da Saúde, candidato derrotado no pleito municipal.
Esquema do “Teatro Invisível”
A decisão revela detalhes de uma estratégia eleitoral que ficou conhecida como “teatro invisível”. O plano consistia em infiltrar atores em filas de banco, pontos de ônibus e outros espaços públicos, simulando conversas casuais com eleitores. Essas conversas eram roteirizadas e tinham o objetivo de espalhar fake news contra o então candidato adversário, Léo Vieira, hoje prefeito reeleito de São João de Meriti.
Esses atores recebiam entre R$ 2 mil a R$ 2,2 mil mensais, mais auxílio para deslocamento. Supervisores da operação chegavam a ganhar R$ 5 mil. Os treinamentos ocorriam no local conhecido como “galpão de gelo”, um imóvel público utilizado como base logística da campanha.
Além disso, servidores comissionados da Prefeitura foram deslocados de suas funções para atuar exclusivamente na campanha de Valdecy, violando a legislação eleitoral.
Investigações da Polícia Federal e bloqueio milionário
As ações do MPE foram embasadas também nas investigações conduzidas pela Polícia Federal, que deram origem à Operação Teatro Invisível, deflagrada em setembro de 2024. A PF constatou que o grupo operava de maneira estruturada desde 2016, com atuação semelhante em ao menos 13 municípios fluminenses, incluindo Belford Roxo, Saquarema e Cabo Frio.
A Justiça Federal autorizou o bloqueio de R$ 3,5 bilhões em bens e contas dos investigados e de empresas ligadas ao grupo. Também foram apreendidos R$ 188 mil em espécie, dois veículos de luxo blindados e documentos que comprovariam a folha de pagamento clandestina dos “atores”.
Perfil dos envolvidos
- Dr. João foi prefeito de São João de Meriti por dois mandatos consecutivos (2017–2024) e já exerceu mandato de deputado federal. Segundo a sentença, ele mobilizou secretarias, veículos e cargos comissionados em apoio à campanha de Valdecy.
- Valdecy da Saúde é deputado estadual e ex-vereador por Meriti. Foi o principal idealizador da estratégia do “teatro invisível” e coordenou diretamente a contratação e atuação dos infiltrados.
- Bebeto é deputado federal e atuou como candidato a vice-prefeito na chapa. De acordo com o MPE, ele cedeu estrutura, recursos e prestou apoio logístico à operação ilegal.
Outros nomes também foram investigados e chegaram a ser presos na primeira fase da Operação, como Bernard R. Soares, Roberto P. Santos, André L. da Silva e Ricardo H. Patrício, apontados como operadores logísticos da campanha.
Provas apresentadas
A sentença reconheceu como provas:
- Uso de servidores públicos em atividades de campanha;
- Utilização indevida de bens públicos, como o “galpão de gelo”;
- Relatórios diários de “pessoas convertidas”;
- Vídeos de treinamento dos atores e áudios com instruções;
- Fake news com marcas falsas do G1 e vídeos editados com deep-fake simulando o Jornal Nacional.
Consequências legais
Com a decisão, os três réus ficam inelegíveis até 2032. O caso também pode gerar processos por improbidade administrativa, organização criminosa e lavagem de dinheiro. A defesa de todos os envolvidos já indicou que irá recorrer.
O prefeito Léo Vieira comentou, em nota, que a sentença “restabelece a lisura do processo eleitoral” e prometeu colaborar com as próximas fases das investigações.
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