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Governo insiste em subir impostos após queda de MP 1303

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Nem bem a MP 1303 perdeu a validade e o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já busca uma nova forma de aumentar a arrecadação para este e o próximo ano. De olho nas eleições de 2026, o governo fará o possível para reaver os R$ 17 bilhões que estimava arrecadar no próximo exercício e evitar cortes em pleno ano eleitoral.

O relator da MP 1303, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), afirmou que, caso a medida não fosse aprovada, o Ministério da Fazenda poderia editar decretos para elevar a tributação e manter a previsão de receitas.

“Tem várias coisas que podem ser feitas por decreto; há definições de alíquotas de imposto que não precisam de lei, como IPI, IOF e outros. Tem portarias, tem uma série de coisas que podem ser adotadas. […] O Supremo reconheceu que o governo tem autonomia para aumentar ou diminuir a alíquota [do IOF] e não tem que consultar o Congresso”, afirmou à imprensa.

Na manhã desta quinta-feira, já com a MP 1303 caducada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, preferiu não adiantar o que o governo poderá tirar da cartola para recalibrar a expectativa de arrecadação, dizendo que as alternativas precisam ser avaliadas por Lula.

“As coisas só se tornam oficiais quando passam pela mesa da Presidência da República. Então, agora, eu estou vendo já uma série de especulações que não correspondem à realidade, porque todas as alternativas, antes de serem oficiais, vão passar pelo crivo da Presidência da República”, disse o ministro a jornalistas na chegada ao ministério.

Também nesta manhã, Lula já apontou para uma possível nova fonte de receitas. “Volto na quarta-feira (15) para Brasília, e aí vou reunir o governo para discutir como que a gente vai propor que o sistema financeiro, sobretudo as fintechs, que tem fintech hoje maior que banco, que elas paguem o imposto devido nesse país”, disse em entrevista à Rádio Piatã FM.

Planalto não deixará o tema morrer

Arnaldo Lima, líder de Relações Institucionais da Polo Investimentos, entende que a derrubada da MP 1303 aprofunda o desequilíbrio nas contas públicas e que o Planalto dificilmente deixará o tema morrer.

Na avaliação do especialista, grande parte do conteúdo da medida será reapresentada via projeto de lei, como estratégia política para transferir ao Congresso — especialmente à oposição — a responsabilidade pela perda de receitas necessárias ao reequilíbrio fiscal.

“Essa postura reforça o discurso de justiça tributária, que o governo pretende explorar no próximo ciclo eleitoral, sobretudo após a aprovação popular da ampliação da faixa de isenção do IR”, afirma.

Em outra frente, Lima entende que a Advocacia-Geral da União poderá intensificar a atuação no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar reverter a desoneração da folha, buscando preservar a meta fiscal e, assim, manter aberta a possibilidade de flexibilização monetária – isto é, queda da taxa básica de juros (Selic) – já no primeiro trimestre de 2026.

Governo terá problemas para fechar o orçamento em 2026

Ainda que as novas medidas arrecadatórias não estejam definidas, uma coisa é certa: com a caducidade da MP 1303, o governo terá dificuldades para fechar as contas neste e no próximo ano, cuja meta fiscal é de superávit de 0,25% do PIB, ou R$ 34,3 bilhões.

De acordo com Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, o impacto neste ano é menos relevante, mas em 2026 será um problema, pois o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) contém receitas incertas em volume elevado.

As projeções da Warren indicam que, para cumprir o centro da meta fiscal, seria preciso cortar R$ 65 bilhões do orçamento. “É impossível”, afirma Salto. “Mesmo usando a banda inferior, ainda seria preciso limar despesas em mais de R$ 30 bilhões. Dificilmente o governo conseguirá resolver o problema. Assim, o cenário mais provável é a alteração da meta de resultado primário”, conclui.

Com elevação da popularidade, Lula abandonou discurso de responsabilidade fiscal

Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, avalia que, após uma leve alta na popularidade no segundo semestre deste ano, Lula abandonou o discurso de compromisso fiscal que havia adotado no fim do ano passado e no primeiro semestre.

“A gente vê o presidente falando em gratuidade de transporte público, a gente vê o presidente falando em aumento de gastos fora do teto. Toda semana a gente não sabe qual vai ser o novo gasto que vai ficar para fora”, disse o estrategista.

Segundo Cruz, “não é novidade para ninguém” que o governo se esforça muito mais com medidas que ampliam a arrecadação — para aumentar impostos — do que com o corte de gastos.

Arnaldo Lima, da Polo Investimentos, não vê espaço para medidas estruturais de corte em gastos obrigatórios em 2025 ou 2026, já que isso exigiria uma mudança impopular na Previdência.

“O governo será forçado a ampliar bloqueios e contingenciamentos, o que tende a conter propostas de viés populista e a preservar as metas de inflação e de resultado primário. É possível, ainda, que discussões sobre aumento do IOF retornem à pauta, sobretudo em função da decisão do STF sobre sua constitucionalidade”, afirma.

MP 1303 foi mantida mesmo após STF validar decreto do IOF

Publicada em 11 de junho, a MP 1303 era uma alternativa arrecadatória após o Congresso ter derrubado o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). No entanto, mesmo depois que o STF manteve a maior parte do decreto que elevou o IOF, no mês seguinte, o governo quis manter a arrecadação da MP.

Ou seja, além da arrecadação extra gerada com o aumento do IOF, o governo ainda pretendia manter os recursos da medida arrecadatória alternativa. Em agosto deste ano, o governo registrou arrecadação recorde com o IOF, alcançando o maior valor mensal da série histórica.

Mesmo com arrecadação extra, contas seguem no vermelho

Somente em agosto, a arrecadação com o IOF chegou a R$ 8,45 bilhões, um incremento real de 35,6% em relação a agosto de 2024, já descontada a inflação.

De acordo com o Impostômetro, a arrecadação de impostos no país chegou a R$ 3 trilhões no dia 7 de outubro, 25 dias antes do que em 2024, o que demonstra um aumento no ritmo da arrecadação de 9,37%.

Mesmo com a arrecadação extra, o governo segue deficitário. No acumulado dos oito primeiros meses do ano, o déficit primário do governo federal foi de R$ 86 bilhões.

Governo não está sendo eficiente no corte de gastos

Gustavo Cruz, da RB Investimentos, afirma que o governo não é eficiente no corte de gastos. “A gente sabe que o Congresso não vai se desgastar com o Judiciário à toa; tem que ser capitaneado pelo governo, mas a gente só vê o ministro Haddad chamar coletiva de imprensa para pedir mais impostos”, afirma.

Cruz também menciona as revisões de auxílios, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que, segundo o governo, também teria reduções por meio de pente-fino e biometria, mas que fechará o ano com gastos superiores aos do ano passado.

Com a caducidade da MP 1303, governo também perde espaço para corte de gastos

Dois pontos da MP 1303 buscavam uma contenção de gastos do governo. Uma das medidas previstas pela MP 1303 era a revisão na concessão do seguro-defeso — benefício pago a pescadores artesanais durante o período de defeso, época em que a pesca é proibida para a reprodução das espécies aquáticas.

O governo tiraria a concessão da gestão municipal, trazendo-a para o Ministério do Trabalho com novos requisitos e fiscalização. Agora, com a caducidade da MP, essa possível redução de gasto já não será mais possível.

Outro ponto era o programa Pé-de-Meia. A MP previa a inclusão dos gastos com o programa no piso da educação — um percentual mínimo de 18% da receita líquida de impostos que o governo precisa investir anualmente na área. Com o fim da MP 1303, o Pé-de-Meia volta a ficar fora do piso da Educação e a incidir como um “novo gasto” para o orçamento.

Em junho, quando a MP foi editada e enviada ao Congresso, a previsão era de que o governo teria uma folga de R$ 12 bilhões no orçamento ao incluir o Pé-de-Meia no piso da Educação.

Em fevereiro deste ano, o Tribunal de Contas da União já havia notificado o governo Lula sobre irregularidades no Pé-de-Meia. As despesas do programa estavam sendo contabilizadas fora do Orçamento, driblando o limite de gastos do arcabouço fiscal.

O que estabelecia a MP 1303

A Medida Provisória 1303, ou “MP Taxa Tudo”, como também foi chamada, era considerada pela equipe econômica essencial para garantir as metas fiscais do próximo ano. Quando foi apresentada, cálculos da Warren Investimentos apontavam para uma receita de R$ 44 bilhões em 2026 com a MP, sendo que R$ 30 bilhões ficariam com o governo federal e R$ 14 bilhões seriam repassados a estados e municípios.

Em vigor desde 11 de junho deste ano, a MP estabelecia a tributação de títulos incentivados (LCI, LCA, CRI, CRA e outros) em 5%, alíquota uniforme de 17,5% sobre várias aplicações financeiras, aumento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das fintechs de 9% para 15% e a elevação da taxação das casas de apostas (“bets”) de 12% para 18%.

O relatório do deputado Carlos Zarattini modificava alguns desses pontos, conforme mostrado pela Gazeta do Povo. Como toda Medida Provisória, a “MP Taxa Tudo” precisava ser aprovada pelo Congresso no prazo de 120 dias, que se encerrou em 8 de outubro.

Em sessão na Câmara, os deputados votaram pela retirada da MP 1303 da pauta e, portanto, por deixá-la caducar e perder a validade.

Fim da MP 1303 é o melhor cenário para o mercado

Segundo Gustavo Cruz, o fim da MP 1303 foi a melhor solução para o mercado, pois a alternativa de aumentar impostos em alguns investimentos poderia criar distorções. O estrategista da RB Investimentos afirma que as altas poderiam desincentivar o mercado de incentivados imobiliários e do agronegócio, assim como as debêntures incentivadas para infraestrutura.

Gabriela Jajah, sócia do escritório SiqueiraCastro, explica que os investimentos com tabela de renda fixa manterão o modelo de tributação regressiva de alíquotas para aplicações financeiras, estimulando os investimentos de longo prazo.

Mesmo para as medidas que vigorariam a partir do 1.º dia de outubro (quarto mês subsequente ao da edição da MP), como o aumento de carga tributária previsto para as empresas de apostas online (“bets”) e o aumento da CSLL para as demais entidades reguladas e supervisionadas pelo Banco Central — como seguradoras, instituições de pagamento e fintechs —, a jurista entende que não haverá impactos, já que, antes mesmo do encerramento do período de apuração, a MP perdeu validade.

Agora, o governo terá que lançar mão de alternativas que não incluam o Congresso para ampliar a arrecadação. Quando uma MP perde a eficácia, os temas discutidos não podem ser objeto de nova MP na mesma sessão legislativa — ou seja, esses temas só poderão ser reenviados pelo governo ao Congresso no próximo ano.

“A Constituição Federal prevê a possibilidade de edição de decreto legislativo dispondo sobre as situações constituídas na vigência da MP”, afirma Jajah. “E, neste caso, o Executivo terá que assumir a autoria da alta de impostos.”

Sem a opção de editar nova MP, uma alternativa seria o envio de um projeto de lei em regime de urgência. Mas não há qualquer sinal de que o Congresso vá se apressar para aprová-lo.

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