A Comissão de Relações Exteriores do Senado criou nesta terça-feira (14) o grupo Brasil-Rússia para intensificar a diplomacia parlamentar entre os dois países. O relatório que propôs a iniciativa cita como motivo uma série de “encontros relevantes” entre parlamentares brasileiros e deputados russos apoiadores do ditador Vladimir Putin, que são alvo de sanções dos Estados Unidos, Austrália, Bélgica e Nova Zelândia e Reino Unido. Foram contrários à proposta apenas os senadores Hamilton Mourão (Republicanos-RS) e Tereza Cristina (PP-MS).
“Eu não dou o meu apoio a esse grupo por duas razões: em primeiro lugar porque a Rússia empreende uma guerra de conquista contra outro país. E isso atenta contra a ordem mundial, contra a ordem internacional e contra os princípios e as relações internacionais que regem a nossa Constituição. Em segundo lugar o Parlamento russo não é democrático. Portanto, não vejo nenhuma vantagem em nós nos relacionarmos com um Parlamento que não atua como o nosso Parlamento”, disse Mourão.
O senador havia alertado na semana passada em discurso no plenário do Senado que as Forças Armadas do Brasil estão sucateadas em um cenário mundial onde há perigo de novas grandes guerras afetarem todo o planeta. A invasão da Ucrânia pela Rússia é vista por analistas internacionais como parte de um esforço de Moscou para conquistar à força o território que constituiu o antigo império russo.
A senadora Tereza Cristina, que presidia a Comissão de Relações Exteriores nesta terça-feira (14), afirmou que a invasão da Rússia à Ucrânia é uma guerra sem sentido e também registrou seu voto contrário à criação do grupo.
O senador astronauta Marcos Pontes (PL-SP) votou pela criação do grupo mas disse ser contrário à compra de óleo diesel russo pelo Brasil. Pontes fez sua missão espacial em uma espaçonave russa antes de ser eleito parlamentar. Em 2024, o Brasil se tornou o segundo maior comprador mundial de diesel russo, atingindo um patamar de compras da ordem de R$ 38 bilhões, segundo o think tank finlandês Centre for Research on Energy and Clean Air (CREA). Moscou usa a exportação de derivados de petróleo como a principal fonte de financiamento da guerra.
A criação do grupo parlamentar Brasil-Rússia foi proposta pela senadora do PL de Alagoas Dra. Eudócia, que não compareceu à sessão nem virtualmente. O projeto foi relatado pelo senador Sérgio Petecão (PSD-AC), que destacou como justificativa para a proposta o comércio internacional e “encontros relevantes” de parlamentares brasileiros com Vyacheslav Viktorovich Volodin, ex-assessor direto de Putin e atual presidente da Duma, equivalente à Câmara dos Deputados na Rússia, e Valentina Ivanovna Matviyenko, ex-governadora de São Petersburgo e presidente do Conselho da Federação da Rússia.
Os dois são alvo de sanções do Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC), órgão do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, que também sancionou o ministro do Supremo Alexandre de Moraes. Eles foram punidos por apoiarem e terem votado de forma favorável à invasão da Ucrânia no Parlamento russo. Volodin também agiu ativamente na anexação ilegal da Criméia pela Rússia em 2014.
Petecão disse respeitar que dois votos foram contrários a seu relatório porque “o Brasil é diferente da Rússia, aqui é um país democrático”.
“Nós somos contra essa guerra. Hoje o mundo todo está preocupado. É um procedimento desleal, desigual da Rússia contra a Ucrânia. Mas eu penso que a nossa relação comercial com a Rússia tem crescido muito. Nós temos que trabalhar para que a paz volte a reinar ali na região, mas nós não podemos de forma alguma virar as costas para um país como a Rússia”, disse Petecão à Gazeta do Povo.
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Criação de grupo ocorre em meio a esforço de propaganda da Rússia no Brasil
Os grupos parlamentares entre países são iniciativas de senadores e deputados para fazer diplomacia parlamentar. A ideia é alocar recursos públicos para financiar a produção de estudos, seminários e encontros políticos entre parlamentares dos países envolvidos para estreitar laços.
Essas iniciativas dão origem a trocas culturais e podem facilitar acordos. Mas os parlamentares não têm poder para influenciar a política externa brasileira, que é uma atribuição do Poder Executivo.
A criação do grupo Brasil-Rússia é fruto de um esforço de Moscou para aumentar sua influência política sobre o Brasil, especialmente com o objetivo de criar uma visão internacional positiva sobre a invasão da Ucrânia.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi à Rússia neste ano para apoiar o ditador Vladimir Putin nas celebrações dos 80 anos do fim da Segunda Guerra, onde figurou ao lado de outros ditadores como Miguel Díaz-Canel (Cuba) e Nicolás Maduro (Venezuela). Além disso, recebeu o chanceler russo Sergei Lavrov pessoalmente no Brasil em ao menos duas ocasiões em seu terceiro mandato.
No campo da diplomacia parlamentar, deputados e senadores brasileiros viajaram à Rússia no fim do ano passado para participar da criação do Fórum de Valores Tradicionais dos Brics (bloco diplomático formado por Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Arábia Saudita, Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos, Indonésia e Irã). O fórum foi criado e idealizado com o patrocínio da Fundação Humanitária Internacional Zakhar Prilepin, ligada ao partido político Rússia Justa – Pela Verdade, que faz parte da base de apoio do ditador Vladimir Putin.
O evento teve sua segunda edição em setembro deste ano na Câmara dos Deputados, em Brasília, e teve forte presença russa. Na ocasião, o deputado russo Dmitry Kuznetsov, aproveitou o evento para tentar difundir propaganda de guerra afirmando que a Rússia não sequestrou mais de 19 mil crianças e adolescentes ucranianos, mas sim os protegeu dos conflitos.
Estudos da Universidade de Yale mostram que eles foram levados para campos de reeducação forçada e treinamento militar. Alguns foram mandados para adoção e nunca retornaram às suas famílias. Isso é considerado crime de guerra e rendeu um mandado de prisão a Putin pelo Tribunal Penal Internacional.
Veja abaixo quais senadores da Comissão de Relações Exteriores foram favoráveis à criação do grupo Brasil-Rússia por aclamação:
- Astronauta Marcos Pontes (PL-SP)
- Beto Faro (PT-PA)
- Carlos Portinho (PL-RJ)
- Chico Rodrigues (PSB-RR)
- Dr. Hiran (PP-RR)
- Efraim Filho (União-PB)
- Esperidião Amin (PP-SC)
- Fabiano Contarato (PT-ES)
- Fernando Dueire (MDB-PE)
- Humberto Costa (PT-PE)
- Jorge Seif (PL-SC)
- Mara Gabrilli (PSD-SP)
- Mecias de Jesus (Republicanos-RR)
- Professora Dorinha Seabra (União-TO)
- Rogério Carvalho (PT-SE)
- Sérgio Petecão (PSD-AC)
- Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB)
- Wellington Fagundes (PL-MT)
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