Início Economia Segundo turno inédito define hoje novo rumo político da Bolívia | Mundo

Segundo turno inédito define hoje novo rumo político da Bolívia | Mundo

Após um primeiro turno surpreendente, a Bolívia vai às urnas neste domingo (19) para um segundo turno inédito, que colocará frente a frente dois candidatos de direita: o senador Rodrigo Paz, do Partido Democrata Cristão (PDC), e o ex-presidente Jorge “Tuto” Quiroga, da coalizão Libre.

Como nenhum deles alcançou o número mínimo de votos necessários para vencer no primeiro turno, eles se enfrentarão em segundo turno. Esta será a primeira vez na história política boliviana que será realizado um segundo turno, já que o mecanismo de segundo turno foi introduzido apenas na Constituição de 2009 e não foi implementado até agora.

O pleito também encerra quase 20 anos de governo quase ininterruptos do partido de esquerda MAS (Movimento ao Socialismo), que não conseguiu apresentar um candidato de consenso, devido à disputa interna entre suas duas principais lideranças: o atual presidente Luis Arce e o ex-mandatário Evo Morales (presidente entre 2006 e 2019).

Entenda a importância e o que está em jogo nesta eleição:

Como funciona a eleição?

Em meio à tentativa de restaurar a confiança nas urnas, o Tribunal Eleitoral boliviano adotou neste ano um novo sistema de apuração, em resposta às denúncias de fraude nas eleições de 2019, que resultaram na renúncia de Morales.

Pelo novo modelo, as atas de votação serão fotografadas nas seções eleitorais e transmitidas diretamente aos centros de apuração. Observadores internacionais da União Europeia e da Organização dos Estados Americanos (OEA) acompanharão o processo.

As urnas abrem às 9h (horário de Brasília) e fecham às 17h. O tribunal pretende divulgar 80% dos resultados preliminares ainda na noite da eleição, enquanto o resultado oficial deve sair em até sete dias.

O que aconteceu no primeiro turno?

Distante da polarização entre MAS e a oposição que dominou a política boliviana, Paz, de 58 anos, se apresentou como uma alternativa moderada. Conseguiu vitórias em antigos redutos do partido e atraiu eleitores de diferentes espectros políticos — especialmente os desiludidos com Arce e Morales.

Sua vitória no primeiro turno surpreendeu: alcançou 32% dos votos, embora as pesquisas lhe dessem menos de 10%. Parte do êxito é atribuída à popularidade de seu vice, Edman Lara, ex-policial conhecido por denunciar corrupção na corporação e por sua forte presença nas redes sociais.

Já Quiroga, que governou o país entre 2001 e 2002, adotou um discurso de ruptura com o governo atual e prometeu medidas duras para enfrentar a pior crise econômica da Bolívia em quatro décadas. Com 65 anos, conquistou apoio da classe média urbana ao apresentar um plano de “reacomodação econômica” considerado mais consistente.

Pesquisa da Ipsos Ciesmori mostra Quiroga na liderança, com 44,9% das intenções de voto, contra 36,5% de Paz. A diferença não é suficiente para que se faça projeções seguras – com 9,3% dos eleitores ainda indecisos ou dispostos a votar em branco.

Quais são as questões centrais nesta eleição?

O principal tema da campanha é a deterioração econômica. O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê crescimento de apenas 0,6% em 2025, reflexo da queda na produção de hidrocarbonetos, que reduziu as exportações de gás e a entrada de divisas.

O combustível tornou-se um dos produtos mais escassos, prejudicando a produção agropecuária, elevando o custo de vida e alimentando o descontentamento social nas ruas. A situação impacta diretamente a população, especialmten com a falta de gasolina.

Essa situação resultou em taxas de inflação que a população boliviana não vivia desde a década de 1980. Até abril de 2025, a inflação acumulada em 12 meses alcançou 15%, enquanto a inflação dos alimentos chegou a 24%, colocando a Bolívia entre os três países da América do Sul com maior inflação, atrás apenas da Venezuela e da Argentina.

Na sexta-feira (17), o FMI discutiu a situação econômica da Bolívia com os candidatos presidenciais do país antes do segundo turno das eleições).

“Foi muito útil ouvir suas visões sobre os desafios que a Bolívia enfrenta e sobre como enxergam as melhores formas de restaurar a estabilidade e o crescimento no país”, disse Nigel Chalk, vice-diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, em uma coletiva de imprensa para o lançamento das perspectivas econômicas da região.

O que propõe cada um dos candidatos?

Embora ambos defendam uma revisão do modelo estatal construído sob o MAS, diferem na profundidade das mudanças e na estratégia fiscal.

Quiroga propõe “mudar tudo”, com um programa de ajuste que inclui a eliminação gradual dos subsídios aos combustíveis, corte de gastos públicos e um plano de “resgate financeiro” com apoio de organismos multilaterais. Ele promete manter programas sociais e defende um referendo para reformar a Constituição, com foco em atrair investimento estrangeiro.

Paz, por sua vez, também defende a redução progressiva dos subsídios — que consomem cerca de US$ 3 bilhões por ano —, mas sem recorrer ao FMI. Ele propõe compensações financeiras para estudantes e idosos, descentralização orçamentária e fechamento de estatais deficitárias.

Seu plano, batizado de “capitalismo para todos”, busca formalizar pequenos negócios e recuperar a confiança na economia. “Os dólares de que o Estado precisa sairão do colchão onde as pessoas os guardam”, costuma dizer, em alusão à fuga de divisas e à informalidade.

Quais serão os desafios do próximo governo?

Independentemente do resultado, o próximo presidente enfrentará um cenário de instabilidade econômica e política, com um caminho repleto de obstáculos.

O primeiro turno também renovou o Congresso, que agora tem maioria de partidos de centro e direita, o que deve facilitar a governabilidade, mas não reduzirá a pressão social. Qualquer tentativa de ajuste fiscal mais profundo pode reacender os protestos em um país historicamente marcado por mobilizações de rua.

Embora o MAS tenha encolhido — elegeu apenas 10 dos 166 parlamentares —, o partido promete manter sua base ativa nas ruas, liderada por Morales e por novas figuras que buscam reorganizar a esquerda boliviana.

O novo governo também herdará o desafio de destravar o potencial do lítio. Os imensos salares do país concentram as maiores reservas conhecidas do mundo, mas a Bolívia ainda não conseguiu desenvolver capacidade produtiva suficiente. Investidores aguardam sinais de que o próximo governo reduzirá barreiras regulatórias e abrirá o setor à exploração estrangeira.

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