A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra a decisão do desembargador Guaraci de Campos Vianna, da 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), que determinou, nesta terça-feira (28), a desinterdição total da refinaria de Manguinhos, da Refit.
No recurso, a que a reportagem teve acesso, a procuradoria ressaltou a competência do STJ para avaliar decisões monocráticas de desembargadores nas instâncias inferiores e destacou o conflito de competência no tratamento do tema, de acordo com a petição.
No sábado (25), a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) desinterditou a maior parte das instalações da refinaria de Manguinhos, mas manteve uma torre de destilação desativada. O desembargador determinou a liberação total da refinaria.
A PGFN apontou no recurso, denominado suspensão de tutela provisória, a existência de “requisitos legais de grave lesão à ordem e à economia públicas” e o “perigo de irreversibilidade dos efeitos das decisões”.
De acordo com a decisão do desembargador, à qual o Valor também teve acesso, o magistrado determinou a realização de vistoria na unidade, com a nomeação da empresa Peritos Judiciais, para avaliar as condições de operação da Refit e as características das cargas de combustíveis apreendidas, além do fim do processo de transbordo do combustível apreendido para as instalações da refinaria, devendo ficar armazenado até decisão judicial.
O desembargador afirmou ainda que a decisão “não está interferindo nas atividades administrativas ou fiscalizatórias de outras instituições ou entidades, mas sim preservando a competência do
juízo universal nos aspectos patrimoniais da empresa, priorizando a atividade econômica, a preservação da empresa e dos empregos e os interesses dos credores”, entre outros pontos.
A PGFN alegou no recurso que as empresas Axa Oil e Fair Energy, as quais tiveram cargas de combustíveis apreendidas em duas etapas da operação Cadeia de Carbono, em setembro, integravam um “núcleo” de um esquema que utilizava empresas de fachada para simular operações de importação e gerar benefícios fiscais indevidos.
A Cadeia de Carbono é um desdobramento de outra operação contra irregularidades no setor de combustíveis envolvendo organizações criminosas, a Carbono Oculto.
A PGFN cita aspectos das investigações que incluem o detalhamento de “uma profunda e suspeita relação” entre Axa Oil e Refit. Diz ainda que a decisão judicial “aniquila o poder de polícia da Receita Federal”.
Parecer antes da decisão
Antes da decisão do desembargador Guaraci Vianna que desinterditou a Refit, a PGFN enviou um parecer ao magistrado, no qual afirmou que as empresas da Refit que recorreram contra a interdição da refinaria de Manguinhos não fazem o recolhimento de tributos, o que comprometeria a tese da empresa de que a paralisação das atividades inviabilizaria o pagamento de impostos estaduais.
Na manifestação, à qual o Valor teve acesso, a PGFN afirma que dados extraídos pelo órgão das demonstrações contábeis da Refit indicam que a empresa não recolheu, em média, R$ 180 milhões por mês, relativos às operações realizadas entre janeiro de 2020 e junho de 2025.
No parecer, a PGFN havia pedido que o desembargador negasse o pedido da Refit e reconhecesse a “incompetência absoluta” da Justiça Estadual para avaliar a desinterdição da refinaria e a liberação das cargas de combustíveis.
“Entre 01/2023 e 06/2025, a dívida corrente da agravante [Refit] cresceu numa proporção correspondente a quase 522% da última parcela recolhida no parcelamento de débitos estaduais com o Rio de Janeiro”, disse a PGFN, no parecer.
O órgão alerta ao tribunal Estadual que a “melhor defesa dos interesses do Estado é pela exigência do cumprimento das obrigações fiscais, diante da demanda inelástica por combustíveis e o regime tributário da monofasia do ICMS, no qual o imposto é cobrado em um dos elos da cadeia — neste caso, a refinaria”.
“Como a demanda não se alterará, logicamente, a exclusão do sonegador contumaz provocará aumento da arrecadação e a melhora das contas públicas no Rio de Janeiro”, disse a PGFN.
A procuradoria disse ainda que a Refit opera “no vermelho”, com uso de sonegação fiscal, para financiar atividades e custear “suposto cumprimento do plano de recuperação judicial”.
O passivo da Refit é mencionado pela PGFN: seriam R$ 8,67 bilhões de dívidas de ICMS em São Paulo; de R$ 1,891 bilhão com o Paraná; e de R$ 13,087 bilhões com o fisco do Rio de Janeiro.
A Receita Federal, diz a PGFN, avalia que “a recuperação judicial da empresa não pode limitar o exercício do Poder de Polícia pelo Estado, sobretudo diante de tantos indícios de fraude e de real comprometimento da concorrência e de outros valores caros à sociedade”.
Em nota, a Refit afirmou que não pratica sonegação de impostos. Ao contrário, disse a empresa, declara suas receitas e paga os tributos, contestando judicialmente, de forma legítima, os valores cobrados indevidamente.
A Refit disse também repudiar a tentativa da Fazenda Nacional de legitimar a interdição das atividades da refinaria e a retenção das cargas da empresa com base “em alegações que já foram tecnicamente refutadas”.
“Laudos elaborados por certificadora e profissional químico independente comprovam que os produtos importados pela companhia não se enquadram na categoria de gasolina automotiva, contrariando as conclusões apresentadas pela ANP. Portanto, não cabe a alegação de fraude tributária”.
A Refit disse ainda que desde o início do processo a partir da apreensão das cargas de combustíveis, a ANP tem apresentado versões divergentes.
Em alguns momentos, segundo a Refit, a agência afirmou que as cargas eram de nafta, insumo que precisa ser refinado para a produção de gasolina, e, em outros, negou a existência de atividade de refino, o que — diz a empresa — “demonstra falta de coerência e excessos nas medidas de fiscalização adotadas”.
A ANP reiterou que segue trabalhando em conjunto com diversos órgãos federais e estaduais, prestando todo o apoio necessário em termos de informações, disponibilização de equipes e análises laboratoriais, entre outros recursos.
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