O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes defendeu nesta segunda-feira (22) que uma eventual proposta de código de conduta para a magistratura seja idealizada internamente pelos ministros da Corte.
A elaboração de um código de conduta para criar diretrizes éticas no âmbito de tribunais superiores é uma iniciativa do ministro Edson Fachin, presidente do STF, e também tem sido defendida por entidades da sociedade civil, ex-ministros do Supremo e parlamentares. As normas são uma ideia antiga de Fachin, mas as discussões em torno da adoção desse tipo de medida cresceram após críticas direcionadas a ministros envolvidos no caso do Banco Master.
Uma das inspirações de Fachin para o código de conduta é o adotado pelo Tribunal Constitucional da Alemanha. O texto prevê que juízes devem divulgar seus ganhos financeiros com palestras e demais atividades ligadas ao setor privado. Também diz que essas atividades não podem atrapalhar a atuação jurisdicional. Além disso, declarações e condutas de magistrados não podem prejudicar a reputação do tribunal. A ideia é que a percepção de imparcialidade é o que garante confiança nas cortes.
Em conversa com jornalistas, no entanto, Gilmar declarou que não houve nenhum debate formal sobre o tema dentro da Corte, mas que considera importante que a medida seja construída pelas mãos dos próprios ministros. “A única coisa que eu reparo é que nenhuma proposta transita aqui, se não for construída aqui”, declarou o decano. “A única coisa que o ministro Fachin conversou comigo foi dizendo que, em relação ao impeachment, queria ter uma conversa com os colegas. Foi a única conversa que ele teve”, acrescentou.
Após a possibilidade de a elaboração de um código começar a circular, o ministro afirmou que o debate público sobre o tema tomou contornos maiores do que a realidade, e que ainda não há uma proposta formal em análise.
“A rigor, eu poderia até brincar com vocês dizendo que esse código de ética é tipo uma batalha de Itararé, porque vocês estão brigando com isso aí e nós não vimos”, disse Gilmar, em referência ao embate divulgado pela imprensa em 1930, durante a Revolução, mas que não ocorreu diante de acordos fechados à véspera da disputa.
Apesar de não se declarar contra a iniciativa, Gilmar é crítico a alguns pontos que estão em debate, como a restrição à participação de juízes em eventos, restrições a declarações públicas e à ampliação dos critérios de suspeição e impedimento para julgar casos.
Em relação aos eventos, Gilmar classificou eventuais restrições como uma “bobagem” e não enxerga problemas na participação de juízes. Segundo o ministro, conversas impróprias não ocorreriam em eventos.
“Acho isso uma bobagem. Eu vou a eventos sempre que eu posso e que me convidam. Não recebo remuneração por isso, então não tenho essa preocupação, que até aparece no tal Código de Ética Alemão. Não acho que ninguém vai ter conversa imprópria em eventos. Se tiver alguém cogitando fazer algo errado, certamente não fará em evento”, argumentou.
Sobre as restrições a declarações, o ministro ponderou que a proibição pode ser problemática, uma vez que impediria a livre manifestação de juízes.
“Se optarem por uma proibição, acho muito problemático, em princípio, tratando-se de ministro do Supremo, que tem um papel importante. Por exemplo, eu vou trazer para o meu caso: eu travei toda aquela batalha contra a Lava-Jato falando, denunciando. Se eu ficasse proibido de falar, obviamente não teria mudado esse quadro”, afirmou.
O ministro ainda ressaltou o risco de estabelecer parâmetros muito abstratos para a suspeição e o impedimento de juízes participarem de processos.
Apesar de ser uma vontade antiga do presidente do STF, o tema ganhou força após o jornal O Globo revelar que Dias Toffoli, relator do caso Master no STF, viajou com o advogado de um dos diretores do banco. O jornal também mostrou que Alexandre de Moraes procurou o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, para falar a favor do banco. Segundo reportagem anterior de O Globo, o escritório da mulher de Moraes tem contrato de prestação de serviços com o Master. Moraes e Toffoli não comentaram os episódios.
Gilmar defendeu os colegas, dizendo que tem “absoluta confiança” em Moraes e que a liquidação da instituição mostra que o sucesso das investigações e do funcionamento dos órgãos de controle.
A eventual criação de um código de conduta tem o apoio de todos os presidentes das cortes superiores e, se avançar, deve ser no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que não vincula o Supremo.
No Conselho, foi criado o Observatório Nacional de Integridade e Transparência do Poder Judiciário. No mês passado, o colegiado definiu os assuntos que deverão ser discutidos nos próximos meses. Entre eles estão a transparência da remuneração da magistratura, além de ética, lobby e conflitos de interesses no sistema de Justiça.
O fato de o código ter a adesão da presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Cármen Lúcia, que também é ministra do STF, mostra que Fachin não está totalmente isolado para elaborar diretrizes na Suprema Corte.
O ministro tem conversado com ex-integrantes do STF, como Rosa Weber e Celso de Mello, a respeito do código de conduta. Celso já defendeu publicamente a medida. Rosa tentou avançar com uma iniciativa semelhante em sua gestão, mas a proposta não vingou. A ideia é avançar no debate com a atual composição da Corte sobre o tema ainda em 2026.
Em discurso de encerramento do ano do Judiciário, Fachin comentou o tema. O ministro disse que está “em gestação” a adoção de um “conjunto de diretrizes éticas para a magistratura”. Foi a primeira vez que ele falou publicamente sobre o tema.
Segundo ele, a autoridade das decisões do STF é sustentada pela “força da razão pública”.
“Desde há muito se realça que a consolidação da democracia depende da internalização de práticas institucionais impessoais e da superação de personalismos que fragilizam as estruturas republicanas”, disse.
@jornaldemeriti – Aqui você fica por dentro de tudo.
Fala com a gente no WhatsApp: (21) 97914-2431
