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Dino freia acordão das emendas e reacende crise com Congresso

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A decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, de barrar a revalidação de R$ 1,9 bilhão de emendas parlamentares escancarou um acordo fechado por líderes do governo com a cúpula do Congresso e empurrou o Planalto para uma nova crise institucional. Ao suspender o “jabuti” incluído em um projeto de ajuste fiscal, o STF desmontou uma articulação política conduzida pelos governistas, reacendendo o embate entre Judiciário e Legislativo em torno das emendas e do antigo orçamento secreto.

O artigo barrado havia sido incluído em um projeto que trata do corte linear de benefícios fiscais e da ampliação da tributação sobre apostas esportivas, fintechs e Juros sobre Capital Próprio (JCP), com previsão de arrecadação de cerca de R$ 20 bilhões. Por não guardar relação direta com o conteúdo original da proposta, o dispositivo foi classificado no jargão legislativo como “jabuti”.

O projeto aprovado na prática faz o governo conseguir fechar as contas dentro da meta fiscal, ao menos no papel. Mas na prática representa um aumento de impostos – ponto que vinha sendo combatido pelo Congresso.

Antes mesmo da sanção presidencial, Dino suspendeu no último domingo (21) os efeitos do trecho aprovado pelo Congresso na última quarta-feira (17), impedindo sua entrada em vigor. O projeto ainda aguarda a decisão de Lula, que tem prazo até 12 de janeiro de 2026 para sancionar ou vetar o texto, mas, mesmo em caso de sanção integral, os efeitos do dispositivo que trata das emendas permaneceriam suspensos por decisão do Supremo.

Segundo o relator da proposta na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), a inclusão do trecho no texto foi para atender a uma demanda do próprio governo. “Foi pedido ao Congresso para não se perder esse espaço orçamentário”, argumentou Ribeiro.

Após a decisão do STF, o próprio presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), procurou Flávio Dino para explicar o acordo que viabilizou a votação do projeto. Assessores do deputado relataram à reportagem que o trecho da proposta que trata da liberação dos restos a pagar foi elaborado pela Casa Civil da Presidência da República e que ministros do governo foram ao presidente da Câmara e ao relator para pedir a inclusão, porque os valores iriam para obras inacabadas e projetos de mais de 10 ministérios.

O trecho suspenso autoriza a revalidação de restos a pagar não processados inscritos a partir de 2019, inclusive aqueles já cancelados, permitindo sua liquidação até o fim de 2026. Na prática, o dispositivo abre caminho para o pagamento de emendas parlamentares não executadas pelo governo entre 2019 e 2023.

A medida beneficia especialmente valores indicados por parlamentares nas extintas emendas de relator — conhecidas como orçamento secreto — além de emendas de comissão. As emendas de relator foram declaradas inconstitucionais pelo STF por falta de transparência e ausência de critérios objetivos de distribuição.

Dino atendeu a um pedido apresentado por parlamentares do PSOL e da Rede Sustentabilidade, que questionaram a tentativa de reabrir espaço para a execução de recursos associados a uma modalidade de emenda já vetada pela Corte.

Em sua decisão, o ministro afirmou que o Supremo, em julgamentos anteriores, não autorizou a “ressuscitação” de restos a pagar vinculados a emendas consideradas inconstitucionais.

“Evidencia que a disciplina ora impugnada extrapola os parâmetros institucionais e as balizas fixadas em conjunto, pelos Três Poderes, para a superação das inconstitucionalidades então reconhecidas”, escreveu.

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Acordo político do governo com o Congresso envolveu PL da Dosimetria

A inclusão do “jabuti” das emendas ocorreu no contexto de uma articulação política mais ampla, que envolveu a tramitação do PL da Dosimetria na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. O líder do governo na Casa, Jaques Wagner, admitiu publicamente ter fechado um acordo com a oposição sem consultar o Palácio do Planalto.

“Não me envergonho do que fiz, estou muito tranquilo na condução da minha liderança e acho que o que a gente fez foi simplesmente colocar em votação aquilo que está para ser votado”, afirmou Wagner na noite de quarta-feira (17). O senador disse ainda que não havia motivo para “empurrar com a barriga” um texto que, segundo ele, já teria apoio para ser aprovado.

Com o acordo, senadores da base governista votaram a favor do PL da Dosimetria, que reduz penas de condenados pelos atos de 8 de janeiro e por participação em tentativa de golpe de Estado. Entre os possíveis beneficiados está o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), preso desde novembro.

Nos bastidores, a articulação de Wagner tinha como objetivo viabilizar a aprovação do projeto do governo que reduz benefícios fiscais federais e amplia a tributação sobre bets e fintechs — texto que acabou recebendo o “jabuti” das emendas. Para o deputado Kim Kataguiri (União-SP), o governo usa a liberação de emendas como instrumento de pressão política.

“Saiu na imprensa a notícia de que o governo estava pagando R$ 5 milhões a deputados da base que votaram neste texto. Isso é uma vergonha. A imprensa está chamando isso de ‘emenda panetone’. É dinheiro de emenda parlamentar para fins eleitorais”, afirmou Kataguiri.

Por causa da participação de governistas no acordo, o episódio passou a ser tratado no Palácio do Planalto como uma exposição desnecessária do presidente Lula. Auxiliares do governo afirmam que a orientação será recomendar o veto ao trecho que trata da revalidação das emendas, mesmo com a suspensão já determinada pelo STF.

Em outra frente, líderes partidários sinalizam que o governo usou a articulação para conseguir viabilizar a aprovação do projeto, mas agora “expõe o Legislativo ao fogo cruzado” com o STF. A avaliação entre os parlamentares é de que o Executivo vai começar o próximo ano já com novos desgates contratados com a cúpula do Congresso.

“A decisão de suspender ou vetar confronta o que foi decidido pelo Legislativo e acordado internamente com todos os partidos. Se a Câmara ou o Senado discordarem, podem recorrer ao STF, mas é uma situação muito delicada, porque já é a última instância e, provavelmente, o entendimento será mantido”, defendeu o deputado Claudio Cajado.

Embate sobre emendas mantém crise do Judiciário com o Congresso

Além da relação de desconfiança com o Executivo, a suspensão do dispositivo que revalida emendas canceladas reforça um conflito que se arrasta desde o fim de 2022 entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal em torno do controle sobre o Orçamento. Desde que a Corte declarou inconstitucionais as emendas de relator (RP 9), base do chamado orçamento secreto, o tema passou a concentrar sucessivas disputas institucionais, com decisões judiciais que impõem limites à execução de recursos e reações do Legislativo em busca de recuperar protagonismo orçamentário.

No entendimento do STF, o Congresso tem recorrido a mudanças formais — resoluções internas, novos formatos de emendas e dispositivos inseridos em projetos de outra natureza — para manter espaços de discricionariedade considerados incompatíveis com os parâmetros de transparência e rastreabilidade exigidos pela Corte. Essa leitura orienta uma série de decisões recentes que condicionaram o pagamento de emendas à apresentação de planos de trabalho, à identificação dos parlamentares responsáveis pelas indicações e à vinculação clara dos recursos às políticas públicas financiadas.

Parlamentares, por sua vez, acusam o Judiciário de extrapolar suas atribuições e interferir em uma prerrogativa constitucional do Legislativo. Lideranças do Congresso argumentam que cabe aos deputados e senadores definir a alocação de recursos orçamentários e que a atuação do STF tem resultado, na prática, em bloqueios generalizados de verbas, afetando bases eleitorais e obras locais.

Nos bastidores, o discurso é de que o Supremo passou a atuar como uma instância revisora permanente do Orçamento aprovado pelo Parlamento. Para 2026, ano eleitoral, foram reservados mais de R$ 61 bilhões para emendas parlamentares. Do montante, R$ 49,9 bilhões serão para as emendas individuais (RP 6), emendas de bancada (RP 7) e emendas de comissão (RP 8). Todas de pagamento obrigatório.

Há ainda reserva para o pagamento de emendas em despesas dos ministérios que ficam sob a gestão do Poder Executivo. O montante destinado a essa categoria ficará em R$ 11,1 bilhões.

“Despesas são uma coisa, investimento é outra coisa. Tem emendas que chegam onde nenhuma verba chegou. Muitas vezes é uma emenda de um deputado ou deputada que faz uma ponte que o Estado brasileiro sequer sabia que era necessária. A gente tem de ter maturidade e equilíbrio para deixar de criminalizar as emendas”, disse o presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (União-AP).

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