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“Tenho tentado construir uma cultura de trabalho presencial alguns dias da semana, com foco em colaboração, troca rápida e sensação de equipe. No papel, todos concordam mas, na prática, percebo que muitos só aparecem por obrigação, chegam tarde, saem cedo ou procuram qualquer razão para ficar em home office. Mesmo com resultados bons, o engajamento presencial simplesmente não acontece. Como posso criar um ambiente que faça as pessoas realmente quererem vir ao escritório, em vez de sentirem que é apenas uma exigência?” Gerente de projetos, 48 anos
Criar uma cultura de convivência presencial no modelo híbrido é, hoje, um dos desafios mais complexos da liderança. A dificuldade que você descreve é extremamente comum. Muitas equipes concordam no discurso, mas a prática não acompanha. A sensação de que as pessoas vão ao escritório apenas por obrigação tem aparecido com frequência nos relatos de executivos de diferentes setores. Porém, isso não significa que o objetivo é inalcançável. Quer dizer que estamos lidando com um período de transição que exige intencionalidade, consistência e propósito.
O primeiro passo é ajustar a expectativa. Presença física não é sinônimo de engajamento, é apenas uma condição possível para que o envolvimento aconteça. As pessoas se mobilizam quando percebem valor claro na experiência presencial. Isso exige que o escritório ofereça algo superior ao que elas têm em casa.
A liderança precisa estruturar encontros que promovam troca real, cocriação e aprofundamento de informações e decisões em temas estratégicos. Também é importante criar rituais de equipe: momentos de alinhamento e práticas de mentoria que prosperam melhor na convivência física. Quando o presencial cumpre um propósito, ele passa a ser visto como investimento e não perda de tempo.
Outro ponto essencial é investigar o que afasta as pessoas. Pois, a resistência ao presencial, muitas vezes, não é sobre o modelo em si, mas tem relação com a experiência vivida. Profissionais que chegam ao escritório e passam o dia em reuniões virtuais ou respondendo e-mails, naturalmente, questionam o motivo da ida. Ambientes sem áreas de silêncio ou pouco ergonômicos geram desgaste. A falta de clareza sobre o que se espera da convivência presencial com os colegas também prejudica.
A escuta é um ótimo caminho para aumentar as chances de acerto. O que faria a sua equipe ter mais ânimo para ir ao escritório? Dos momentos vivenciados no presencial, qual é o mais significativo para o seu time? Há desconfortos no expediente presencial que podem ser melhorados ou eliminados? Esses são alguns mapeamentos que podem direcionar a companhia para práticas mais efetivas. Essa pesquisa pode, inclusive, permitir respostas anônimas para que as pessoas possam ser sinceras.
Coerência e firmeza são importantes nesse processo. Se a empresa decidiu que o híbrido faz mais sentido para o negócio, é importante sustentar essa escolha com base em dados e fatos. É, ainda, fundamental entender que resistência faz parte de qualquer mudança corporativa, mas nem sempre ela se manifesta como um sinal de erro estratégico da empresa, de rebeldia da equipe ou falha da liderança.
Nesse contexto, há profissionais que simplesmente não desejam mais nenhum nível de presencialidade e, em algum momento, buscarão empresas que operem no modelo 100% remoto. Isso faz parte do ciclo natural desse novo momento que estamos vivendo nas empresas.
Prepare-se para perder pessoas e mantenha o foco em quem está disposto a permanecer no modelo híbrido, entendendo o valor das interações presenciais e contribuindo para a construção da cultura desejada.
Esse ponto se conecta diretamente aos processos de contratação. Para que o híbrido funcione, é importante selecionar profissionais que enxerguem sentido no trabalho presencial. Empresas que alinham esse aspecto desde o início têm observado maior aderência e menos conflitos ao longo do tempo. O modelo cultural se fortalece quando existe coerência entre expectativa e prática.
Além disso, há inúmeros relatos de companhias que retomaram parte da presencialidade e perceberam impacto positivo na criatividade, na velocidade das decisões e no surgimento de projetos relevantes entre uma conversa informal e outra. Algo difícil de replicar em ambientes totalmente remotos.
Outro fator importante é a qualidade da experiência no escritório e no deslocamento ao trabalho. Áreas para reuniões rápidas, zonas silenciosas para atividades que exigem foco, ambientes adequados para reuniões de feedback e salas que facilitam discussões estratégicas fazem diferença. Quando possível, outra medida que tende a engajar a equipe no presencial é oferecer alguma flexibilidade no horário de entrada e saída para que as pessoas possam evitar trânsito ou transporte público lotado.
Por fim, vale lembrar que a pergunta central não deveria ser “Como convencer as pessoas a cumprirem expediente presencial?”. O mais efetivo é se questionar: “De que forma elas podem perceber valor em sair do home office para trabalhar na empresa?”. Diretrizes corporativas claras, ganhos individuais bem comunicados e um propósito coletivo bem estruturado são boas bússolas nessa jornada.
Quando a liderança cria condições para trocas mais ricas, relações mais fortes, aprendizado mais rápido e decisões mais eficientes, a presença deixa de ser obrigação e se torna escolha. E é nessa migração de pensamento que o modelo híbrido se sustenta de forma saudável e duradoura.
Isis Borge é headhunter, diretora executiva da Talenses e sócia do Talenses Group onde atua com recrutamento executivo e lidera a seleção no C-level para energia e indústria.
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Esta coluna se propõe a responder questões relativas à carreira e a situações vividas no mundo corporativo. Ela reflete a opinião dos consultores e não a do Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações.
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