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Como conquistar mais autonomia no trabalho? | Carreira no Divã

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“Entrei cheia de entusiasmo na empresa, querendo contribuir além do que estava no meu escopo inicial. Aos poucos, passei a identificar gargalos, sugerir ajustes simples e pensar em melhorias que poderiam facilitar o trabalho de todo o time, mas minhas ideias raramente eram levadas adiante e algumas sequer eram consideradas. Com o tempo, isso começou a me desmotivar e a me fazer sentir travada, como se minha iniciativa não tivesse espaço ali. Como ter mais autonomia no trabalho? Posso conversar com meu superior para tentar reverter essa situação?” Analista de projetos, 29 anos

Você descreve uma situação bastante comum em ambientes corporativos: uma pessoa chega cheia de energia e novas ideias e, pouco tempo depois, tem a percepção de não se sentir ouvida e valorizada. O resultado costuma ser exatamente o que você relata: desmotivação, sensação de travamento e, em alguns casos, a dúvida sobre a própria capacidade ou sobre “como jogar o jogo”. Acredito que o fato de você estar refletindo sobre o tema é positivo. Isso demonstra que ainda tem chances de reversão desse cenário.

É saudável planejar como conversar com seu gestor para entender melhor o cenário, antes de concluir que ali não existe espaço para autonomia. Eu entendo que vale diferenciar e separar bem duas coisas que frequentemente se misturam: o desejo legítimo de ter mais protagonismo; e a forma como a empresa, o gestor e o contexto operam para transformar ideias em decisões.

Autonomia não é apenas “poder fazer do meu jeito”. Em organizações maduras, a autonomia é um equilíbrio entre liberdade e responsabilidade. Você ganha mais espaço quando demonstra que consegue tomar decisões com critério, priorizar o que importa, reduzir riscos e entregar resultado com consistência. Já em companhias menos maduras, ou muito hierárquicas, a autonomia, às vezes, é interpretada como ameaça, crítica ou até como quebra de lealdade. O comportamento pode até ser visto como iniciativa de “alguém que quer apenas aparecer”, dependendo da cultura, do timing e de quem está ouvindo. Por isso, o primeiro passo é avaliar o ambiente com objetividade, sem julgamento e sem perder sua intenção positiva.

Uma boa análise começa com perguntas básicas. Que tipo de empresa é essa? Mais tradicional e avessa a mudanças ou mais experimental e orientada a melhoria contínua? Existe governança clara de processos, com rituais de revisão e comitês, ou as decisões são centralizadas e dependem de poucas pessoas? Qual é o momento do negócio: estabilidade, crescimento acelerado, reestruturação, troca de liderança ou corte de custos?

Colunista destaca que mudanças pequenas e bem-sucedidas criam reputação de execução e abrem portas para mudanças maiores — Foto: Unsplash

Para quem já estava no dia a dia da empresa antes da sua chegada, mudanças, ainda que simples, podem ser percebidas como risco em momentos de instabilidade. Quando o cenário é de alta pressão, gestores tendem a priorizar execução e a previsibilidade, não transformação. Então, veja que não é sobre você estar certa ou errada. Tem a ver com qual “moeda” está valendo mais na atual fase da organização: eficiência imediata ou melhoria estrutural.

O segundo ponto de avaliação é o perfil do seu gestor. Há líderes que gostam de pessoas propositivas, mas precisam que a proposta venha no formato “certo”. Há gestores que até concordam com sugestões da equipe, mas não têm energia política para bancar mudanças. Há aqueles que filtram tudo o que reportam à alta direção, o que pode fazer com que uma ideia morra nessa espécie de peneira. E há os que, por insegurança, controlam demais, barrando qualquer iniciativa que não tenha vindo deles ou passado por sua avaliação. Perceba que, em todos esses cenários, a solução muda. Se o obstáculo é formato, você ajusta como apresenta. Se é política, você precisa de aliados. Se é controle, você negocia escopo e combinações claras. Se é falta de prioridade, você mostra impacto e cria um processo de implementação progressiva.

Considere, ainda, um ponto sensível, mas necessário: a avaliação sincera do conteúdo e do encaixe das suas propostas. Às vezes, a ideia é boa mas não está adequada ao momento, à cultura ou à maturidade dos processos internos. Como eu mencionei anteriormente, algumas sugestões podem soar como “crítica ao que já existe”, ainda que não seja sua intenção. Outras podem bater de frente com padrões informais que sustentam a operação (mesmo que sejam ruins). E há ideias que, na prática, geram um esforço de mudança maior do que o benefício percebido.

Tenha em mente que a autonomia é exercitada quando você demonstra senso crítico e discernimento: escolher as batalhas certas, entender dependências, medir trade-offs (contrapartidas) e apresentar opções. Adotar esse posicionamento não te coloca no lugar de alguém que mina o próprio entusiasmo para não ter problemas. É, na verdade, uma forma de atingir objetivos de maneira estratégica.

Uma forma prática de aumentar a chance de suas sugestões avançarem é migrar do campo do “acho que seria melhor” para o do “tenho evidências e um plano de teste”. Troque melhorias amplas por pequenos experimentos. Veja um exemplo de abordagem nesse contexto: “Percebi que esse gargalo aumenta o tempo de ciclo em X dias e gera retrabalho em Y%. Posso fazer um piloto de duas semanas com um ajuste simples, em um time pequeno? Eu mesma me responsabilizo por medir impacto e riscos. Se não funcionar, voltamos ao modelo atual. O que você acha?” Essa abordagem reduz o medo, diminui o custo político e demonstra maturidade. E, nesse processo de evolução, talvez sua liderança tenha a percepção de que a mudança que você está propondo não se trata de uma revolução.

Outra chave é a sua comunicação. Mesmo quando a ideia é ótima, a contextualização importa. Em ambientes mais sensíveis, comece reconhecendo o que funciona: “o processo atual tem pontos fortes, especialmente em A e B. O que eu observei é uma oportunidade pontual em C, que pode nos ajudar a reduzir retrabalho”. Diga isso em vez de simplesmente indicar que “o processo é ruim”. Assim, você sinaliza respeito e foco em melhoria. Nessa mesma linha, troque: “a gente deveria” por “posso apoiar com”; ou “isso não faz sentido” por “qual é a premissa por trás disso?”. Isso demonstra que você quer entender para propor algo compatível, e também te posiciona como alguém que resolve, não apenas aponta problemas.

Conversar com seu superior não só é possível como costuma ser o caminho mais saudável. A diferença está na intenção e na estrutura desse diálogo. Evite um discurso pautado apenas pela frustração, como “minhas ideias não são ouvidas”. Opte pelo alinhamento entre ideias, realidade e expectativas: “quero entender melhor como você define autonomia no meu papel e qual seria o melhor formato para eu contribuir e apresentar sugestões. Também quero calibrar que tipo de proposta faz mais sentido para você. Qual é a prioridade do time neste trimestre?”.

Depois, apresente dois ou três exemplos reais de sugestões que você fez e que foram ignoradas ou rejeitadas. Faça isso sem nenhum tom de acusação. E pergunte: “o que faltou para avançar? Era timing? Era formato? Havia riscos que eu não considerei? Você me ajuda a ler isso?”. São perguntas que costumam abrir espaço para feedback real, uma excelente matéria-prima tanto para conquistar autonomia quanto para melhorar a relação de confiança entre você e quem te lidera.

A partir daí, proponha um acordo explícito de autonomia. Algo como: “se eu assumir a responsabilidade de mapear impacto, envolver as áreas necessárias e apresentar opções, posso conduzir melhorias dentro deste escopo?”. Recomendo isso porque, na prática, autonomia é um acordo que precisa ser bem combinado para dar certo. Inclua rituais nesse combinado: uma reunião quinzenal curta para você apresentar propostas e status de pilotos. Não porque você precise pedir permissão para tudo, mas porque valoriza confiança, previsibilidade e alinhamento.

Também vale mapear “onde” a sua autonomia pode nascer. Às vezes, o espaço não está em mudar processos estruturais, mas em melhorar entregáveis, criar templates, organizar fluxos de comunicação, propor métricas, construir um dashboard ou simplificar a interface entre áreas. Mudanças pequenas e bem-sucedidas criam reputação de execução e abrem portas para mudanças maiores. A sequência importa: autonomia raramente vem antes da confiança; geralmente vem depois.

Por fim, faça uma leitura de longo prazo. Se, mesmo com ajustes de comunicação, pilotos bem desenhados e conversas transparentes, a empresa continuar desincentivando suas iniciativas, isso não significa que você “errou”. Significa que pode haver um desalinhamento entre o seu estilo de trabalho e a cultura da companhia. Algumas carreiras florescem em ambientes de liberdade e experimentação; outras se desenvolvem em ambientes estruturados, desde que exista clareza de trajetória e abertura para evolução.

Se o padrão for sistemático e imutável, talvez a pergunta deixe de ser “como ter mais autonomia aqui?”, e seja a hora de passar a se questionar: “esse ambiente me permite ser a profissional que eu quero ser nos próximos dois anos?”. É sinal de maturidade ajustar a própria abordagem para alcançar os objetivos. Mas é igualmente maduro reconhecer quando as próprias escolhas precisam de ajuste.

Seu entusiasmo é um ativo. O objetivo não é reduzi-lo, mas sim canalizá-lo com estratégia: ler o ambiente, escolher batalhas, propor testes, assumir responsabilidade, construir aliados e contratar autonomia com o gestor. Se você fizer isso e ainda assim nada mudar, pelo menos você terá duas certezas valiosas: que tentou com método e que está pronta para buscar um lugar em que iniciativa não seja um risco, e sim parte do trabalho.

Isis Borge é headhunter, diretora executiva da Talenses e sócia do Talenses Group onde atua com recrutamento executivo e lidera a seleção no C-level para energia e indústria.

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Esta coluna se propõe a responder questões relativas à carreira e a situações vividas no mundo corporativo. Ela reflete a opinião dos consultores e não a do Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações.

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