A aliança entre os regimes da Rússia e da China tornou-se um dos principais pilares da máquina de guerra russa desde o início da invasão da Ucrânia, em 2022. Mesmo evitando a venda direta de armamentos, Pequim tem fornecido componentes eletrônicos, motores e tecnologias de uso duplo que permitem a Moscou manter ativa sua produção de drones, mísseis e veículos militares – um movimento que especialistas classificam como essencial para a sobrevivência da indústria bélica russa.
Segundo o Centro de Análise de Políticas Europeias (CEPA), a cooperação sino-russa atingiu novo patamar após 2022. Pequim passou a responder por 89% das importações russas de microchips e quase metade dos equipamentos de fabricação de semicondutores usados no país. Além disso, as exportações chinesas de nitrocelulose, substância essencial na produção de pólvora e explosivos, cresceram de praticamente zero antes da guerra para 1.300 toneladas em 2023.
De acordo com editorial publicado pelo jornal Washington Post, relatórios confidenciais elaborados para o Departamento de Estado dos Estados Unidos e governos europeus rastrearam cadeias de suprimentos que conectam fabricantes chineses a empresas russas sancionadas por apoiar o esforço militar em Kiev. O think tank ucraniano Center for Defense Reforms identificou, por exemplo, que a empresa chinesa Shenzhen Kiosk Electronic Co. exportou mais de 3,3 milhões de motores elétricos à Rússia apenas no ano passado. Esses componentes, embora tenham usos civis, foram destinados à Rustakt LLC, fabricante de drones sancionada pela União Europeia por seu papel na guerra.
Conforme a mesma investigação, entre julho de 2023 e fevereiro deste ano, a Rustakt importou quase US$ 294 milhões em produtos chineses, incluindo US$ 83 milhões em motores elétricos. O relatório afirma que a empresa opera não apenas como produtora, mas também como um “centro logístico” que redistribui peças a outros fabricantes de drones militares russos.
De acordo com o The Economist, a participação chinesa na cadeia militar russa vai além dos drones. Autoridades ocidentais afirmam que a China fornece pequenas quantidades de munições de artilharia, explosivos, fibras ópticas e componentes eletrônicos críticos, além de máquinas industriais utilizadas na fabricação de projéteis. O chefe da inteligência externa da Ucrânia, Oleh Ivashchenko, declarou que a China se tornou o principal fornecedor de equipamentos industriais à Rússia entre 2023 e 2024, respondendo por 80% a 90% das importações desse tipo.
Relatórios do Departamento de Segurança da Lituânia reforçam essa avaliação. Um levantamento divulgado neste ano pelo departamento revela que “a guerra na Ucrânia serve aos interesses de Pequim” e que a China fornece à Rússia neste momento equipamentos e tecnologias de uso duplo que “reconstituem e desenvolvem suas capacidades militares”, permitindo-lhe manter a invasão em curso na Ucrânia e contornar sanções.
A cooperação entre os dois países inclui ainda a realização de exercícios militares conjuntos e o compartilhamento de tecnologias sensíveis. Conforme o CEPA, Moscou oferece à China acesso a sistemas de defesa antiaérea, radares e propulsão naval, enquanto Pequim retribui com componentes eletrônicos e apoio financeiro.
Analistas do Instituto de Estudos da União Europeia (EUISS) descrevem a relação entre China e Rússia como uma dependência assimétrica.
“Moscou tornou-se progressivamente mais dependente, enquanto Pequim usa a Rússia como mercado para absorver seus produtos e consolidar influência política”, escrevem os analistas Alessia Caruso e Tim Rühlig. A conclusão do instituto é que, embora a cooperação militar e diplomática continue, a China ajusta seu grau de envolvimento sempre que o custo econômico ou diplomático se torna elevado.
O comércio bilateral entre os dois países também segue em expansão. Desde o início da guerra, as trocas comerciais entre China e Rússia aumentaram cerca de 30% ao ano, segundo dados oficiais citados pelo governo lituano. A Rússia exporta petróleo e gás com grandes descontos, enquanto importa da China veículos, equipamentos industriais e bens tecnológicos que substituem produtos ocidentais bloqueados pelas sanções.
Conforme destacou o Washington Post, essa teia de apoio chinês tem permitido que Moscou continue fabricando drones de longo alcance, mísseis e equipamentos eletrônicos essenciais para manter sua invasão em curso na Ucrânia – tornando Pequim, nas palavras do editorial do jornal, “o principal facilitador externo do imperialismo russo”.
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