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‘Brasil não pode ser servo dos senhores feudais da tecnologia dos EUA’, alerta Nobel de Economia | Brasil

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Na lógica de que a inovação por meio de novas ideias é motor do desenvolvimento econômico, o prêmio Nobel da Economia de 2018, Paul Romer, alertou que há um risco embutido nesse processo: o surgimento e fortalecimento de monopólios. Para o economista, essa situação já se manifesta no controle crescente da tecnologia e da inteligência artificial (IA) por parte de algumas gigantes do setor, o que também implica domínio sobre o comportamento social via redes digitais.

No caso do Brasil — um dos países que mais utilizam esse tipo de tecnologia —, Romer recomenda regulação pública para preservar “a soberania digital e política”.

“O Brasil não pode ser servo dos senhores feudais da tecnologia dos Estados Unidos. Não deixem que as gigantes da tecnologia destruam seus sistemas político e econômico”, recomendou o economista. A avaliação foi feita diante de um público de empresários, em São Paulo, nesta terça-feira (14), durante evento promovido pela Confederação Nacional do Comércio (CNC).

Romer sugeriu que o Brasil invista em ciência, software aberto e segurança cibernética, inspirando-se em políticas de países como Índia e Israel. Ele citou o caso israelense, em que o treinamento de jovens em codificação e defesa digital pelo Exército resultou na formação de uma das maiores indústrias de segurança cibernética do mundo. “Há oportunidades para construir uma regulação moderna, transparente e inclusiva. O Brasil pode defender seu sistema político e econômico se agir agora.”

Romer criticou o modelo americano de monopólio digital, que concentra poder econômico e informacional em companhias como Google, Meta, Amazon e Microsoft, e defendeu que países em desenvolvimento criem mecanismos próprios de regulação e tributação. Ele sugeriu, por exemplo, taxar a receita obtida no país por essas plataformas — e não apenas o lucro corporativo, de difícil rastreio.

“A IA pode ser boa para a educação, mas se for controlada por Musks ou Zuckembergs, eles vão sugar todo valor que puderem e vão manipular vocês. Por isso, o Brasil precisa assumir controle, e a única maneira é conhecer os fatos e ter uma entidade de regulação e um setor científico fortalecidos. [A solução] é investir em ciência e em código aberto e se preparar para resistir”, reforçou.

Segundo Romer, nos Estados Unidos vive-se uma crise de governo que perdeu o poder de dizer não a gigantes do mercado, fazendo referência a Donald Trump estimular projetos privados a exemplo de Elon Musk. “Lá, a democracia perdeu o controle sobre essas empresas”, disse, ao afirmar que o modelo de propaganda digital baseado em vigilância e manipulação de dados “não é um sistema competitivo”.

Embora tenha se mostrado pessimista em relação ao avanço dos monopólios digitais nos Estados Unidos — especialmente pelo projeto do empresário Elon Musk de desenvolver robôs capazes de substituir o trabalho humano — Romer considera o Brasil um país capaz de liderar inovações alternativas a esses conglomerados tecnológicos.

O economista destacou ainda que um governo forte e técnico é essencial para lidar com os riscos da tecnologia e dos monopólios digitais.

“As ideias permitem que a sociedade avance, mas quando alguém tenta se apropriar delas — como se Elon Musk pudesse cobrar toda vez que alguém usasse o teorema de Pitágoras — o resultado é injusto e perigoso”, afirmou, criticando o monopólio como maior risco para o desenvolvimento econômico pautado em ideias inovadoras, tema de suas pesquisas que o fizeram vencer o Nobel, em 2018.

“Meu sentimento é de que a mídia social pode ser um veneno para democracia, como o chumbo foi para as pessoas no passado. Não nos demos conta desse problema não só na política, mas na vida dos jovens, que é um desastre”, ressaltou.

Com a mesma percepção, James Robinson, ganhador do Nobel de Economia de 2024, alertou para a importância do mercado de patentes como ferramenta para defender a ciência e a inovação aberta em um país. Quando recebeu o prêmio, Robinson estudava o avanço do desenvolvimento econômico nas Américas a partir de patentes, conhecimento compartilhado e regimes democráticos.

De acordo com Robinson, que também participou do evento Global Voices, é comum que democracias — ainda que com desigualdades — tenham mais sucesso no compartilhamento de ideias e no desenvolvimento econômico do que regimes autoritários, mesmo que a velocidade de crescimento não corresponda às expectativas sociais.

Às ideias defendidas por Romer, o britânico acrescenta que é fundamental promover inclusão social nas instituições públicas, de onde emergem as soluções para a prosperidade de um país. Autor de Why Nations Fail (Por que as Nações Fracassam), Robinson defendeu que a base do desenvolvimento está na ampla distribuição de poder político e na consolidação do Estado de direito.

“O que diferencia países prósperos de economias estagnadas é a inclusão das pessoas nas instituições e o acesso equitativo às oportunidades”, disse o economista.

Segundo ele, a correlação entre Estado de direito e renda per capita é direta: quanto mais forte o arcabouço institucional e maior a aplicação efetiva das leis, maior tende a ser o nível de renda, inovação e produtividade.

Robinson citou o exemplo dos Estados Unidos, onde o sistema de patentes, incorporado à Constituição, favoreceu o surgimento de novas ideias e empresas.

“Esse é um tipo de inclusão que permite que a descoberta beneficie toda a sociedade. Em países pobres, as pessoas não são incentivadas nem incluídas nesse processo”, observou.

O economista comparou a América Latina — onde o número de patentes permanece próximo de zero — a economias como Coreia do Sul e China, que viveram transições impulsionadas pela inovação e hoje figuram entre as nações com maior volume de registros tecnológicos.

“As instituições estão por trás da inovação. O problema é que, em muitos países, as políticas econômicas respondem a interesses autocráticos e não ao fortalecimento do Estado de direito”, afirmou.

Para Robinson, a qualidade das instituições políticas continua sendo o principal fator de divergência entre países ricos e pobres. “Sem inclusão nas instituições, não há base sólida para inovação, nem para o crescimento sustentável da economia”, afirmou.

Em detrimento às economias emergentes que conseguirão fazer alianças entre si e dar continuidade à globalização, conforme apontou Romer, os dois economistas veem os EUA se afastando cada vez mais da ideia central deste conceito sob a justificativa de incentivar a economia nacional. Com isso, temas como imposição de tarifas salientarão o poder comercial de nações que dependem pouco da parceria com os norte-americanos, como são os casos do Brasil e Índia.

“A dimensão mais séria desse cenário é a ameaça de Donald Trump utilizar tarifas comerciais como forma de punir o Brasil por um eventual processo contra Jair Bolsonaro. Essa postura viola um consenso de soberania, que garante aos povos o direito à autodeterminação”, disse Roomer.

Segundo ele, países como o Brasil precisam construir alianças agora para impedir uma regressão às antigas normas dos impérios — quando potências estrangeiras ditavam o que nações soberanas deveriam fazer. “É como se o chefe imperial dos Estados Unidos dissesse o que o Brasil deve fazer.”

Para Romer, Rússia, China e os próprios Estados Unidos parecem estar retomando uma lógica de poder imperial baseada na força. Nesse contexto, a Índia se apresentaria como um aliado natural do Brasil na defesa da soberania nacional frente à coerção das grandes potências, e diversas nações poderiam apoiar essa iniciativa. “A resposta, portanto, deve ser coletiva, com contramedidas coordenadas — inclusive em relação às tarifas”, disse.

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