O ataque de drones russos contra a Polônia, no começo deste mês, escancarou uma vulnerabilidade estratégica da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan): a aliança ainda depende de sistemas caríssimos para neutralizar ameaças baratas e improvisadas.
A ofensiva, realizada com cerca de 19 aeronaves de madeira e isopor avaliadas em US$ 10 mil cada – de acordo com a imprensa americana e europeia, obrigou os aliados a disparar mísseis Patriot de US$ 3,5 milhões e acionar caças F-35, cujo custo por hora de voo supera US$ 40 mil.
A ação russa evidenciou o que analistas chamam de “gap de capacidades” da Otan: sistemas antiaéreos projetados para abater caças de última geração e mísseis balísticos estão sendo utilizados para enfrentar drones rudimentares, desequilibrando a relação custo-benefício da defesa dos países-membros. Segundo análise do New York Times, essa fragilidade tem sido explorada de maneira calculada por Moscou, que impõe à aliança gastos milionários com ataques de baixo investimento – numa estratégia que, de acordo com analistas, pode até ter como resultado final um certo esgotamento de recursos da Otan.
Autoridades polonesas confirmaram essa avaliação ao afirmar que o objetivo central do Kremlin com o ataque da semana passada foi testar a prontidão da aliança e medir a quantidade de recursos que seriam empregados diante de uma situação de risco. Diplomatas europeus, ouvidos pelo Times, também enquadraram a ofensiva na Polônia como parte da “guerra híbrida” conduzida por Moscou.
“A Rússia tentou nos testar sem iniciar uma guerra”, afirmou em entrevista ao Guardian o ministro das Relações Exteriores da Polônia, Radosław Sikorski.
De acordo com análise do jornal Politico, o problema não está apenas no custo desproporcional da resposta da Otan ao ataque da semana passada, mas também na ausência de sistemas intermediários de defesa aérea entre os países da aliança. Hoje, os membros da Otan dependem sobretudo de caças de última geração e mísseis de alto valor para conter drones improvisados, quando o ideal seria dispor de alternativas mais simples e baratas para combater ataques desse tipo – o que também permitiria preservar recursos para enfrentar incursões de maior intensidade, caso ocorram.
“Precisamos nos equipar melhor contra drones”, afirmou ao Politico Ulrike Franke, pesquisadora do Conselho Europeu de Relações Exteriores. “Enviar F-16 e F-35 todas as vezes [que um país da aliança é atacado por drones baratos] não é sustentável”, acrescentou.
A própria cúpula da Otan reconhece que a atual estratégia de defesa aérea contra drones rudimentares é insustentável. Em reunião recentemente realizada com embaixadores da União Europeia, o secretário-geral da aliança, Mark Rutte, afirmou que interceptar esse tipo de ameaça com caças F-35 é “insustentável”, segundo revelou o Politico. Um diplomata presente no encontro confirmou ao jornal que “ninguém discordou disso”.
Exercícios e novas tecnologias
Segundo a mídia europeia e americana, a Otan tem avaliado nos últimos meses alternativas mais baratas e eficazes para enfrentar drones de baixo custo, como os utilizados pela Rússia na semana passada. Entre as opções em estudo estão sistemas a laser, mísseis de menor valor – como o modelo Nimbrix, desenvolvido pela empresa sueca Saab – e sensores acústicos semelhantes aos empregados pela Ucrânia para detectar aeronaves pelo som.
Além disso, nesta semana, a Otan iniciou testes com novas tecnologias contra drones russos em bases militares de Troia (Portugal) e Den Helder (Holanda). As forças da aliança experimentaram drones aéreos e submarinos para reforçar a vigilância, além de embarcações teledirigidas impressas em 3D, desenvolvidas em parceria com universidades e empresas privadas, o que pode diminuir o custo de produção.
O teste ocorre em meio a novas tensões, após incursões com drones forçarem nesta semana o fechamento temporário de aeroportos e atingirem instalações militares na Dinamarca. O governo dinamarquês classificou os episódios como “ataques híbridos” e reconheceu que um “ator profissional” está por trás das ações.
Segundo a primeira-ministra Mette Frederiksen, não se pode descartar o envolvimento russo neste ato, embora Moscou negue responsabilidade.
“A Rússia será uma ameaça para a Europa e para a Dinamarca durante anos”, disse a premiê.
O contra-almirante Massimiliano Rossi, chefe do Estado-Maior do Comando de Operações Especiais da Otan, incursões como a dos drones russos na Polônia, Estônia e Dinamarca mostram a necessidade de soluções de baixo custo. Ele elogiou a impressão 3D como alternativa para produzir “embarcações de superfície ou outros equipamentos a preços reduzidos, diminuindo o impacto econômico”.
Esses ensaios foram baseados na experiência da guerra na Ucrânia, onde o uso de drones e embarcações não tripuladas se desenvolveu rapidamente. Forças especiais ucranianas participaram dos exercícios na Holanda.
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