O presidente Donald Trump anunciou que os Estados Unidos retomarão seus testes nucleares, paralisados há mais de 30 anos, reacendendo o que pode ser uma nova era de proliferação de armas nucleares entre as potências globais.
“Devido aos programas de testes de outros países, instruí o Departamento de Guerra a iniciar os testes de nossas armas nucleares em igualdade de condições”, escreveu o líder da Casa Branca no mesmo dia em que o ditador russo, Vladimir Putin, provocou Washington com testes de um supertorpedo.
Trump enfatizou que o processo de retomada dos testes seria “imediato”, apesar de não ter especificado se envolveria diretamente armas nucleares ou se seriam testados sistemas de armas com capacidade nuclear. O anúncio chegou rapidamente aos ouvidos de China e Rússia, potências que estão expandindo seus arsenais e são consideradas ameaças aos Estados Unidos.
Um porta-voz do regime chinês, Guo Jiakun, afirmou nesta quinta-feira (30) que a China espera que os Estados Unidos cumpram “seriamente” suas obrigações de acordo com o Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares, de 1996.
Apesar da declaração pública, a ditadura de Xi Jinping tem expandido rapidamente sua capacidade nuclear – atualmente, a China possui cerca de 600 ogivas nucleares, a maioria delas projetada para mísseis terrestres, segundo relatório da Federação de Cientistas Americanos (FAS, na sigla em inglês). Desse número aproximado, cerca de 24 estão em operação.
O think tank americano Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS) estima que a China praticamente dobrou seu arsenal nuclear nos últimos cinco anos e a expectativa é que ultrapasse mil armas desse tipo até 2030.
Apesar do número ainda ser inferior ao que Rússia e Estados Unidos possuem – cerca de 5.580 e 5.225, respectivamente, segundo relatório da Associação de Controle de Armas – Washington tem aprimorado sua própria capacidade para responder ao avanço chinês no campo nuclear. Dados do Departamento de Defesa americano, no entanto, apontam que Moscou possui 4.300 ogivas, contra 3.700 de Washington.
O discurso de desescalada do regime de Xi parece não combinar com a realidade dentro da China. Nesta semana, foi divulgado o novo plano de desenvolvimento do país para os próximos cinco anos, que prevê o fortalecimento das capacidades de dissuasão estratégica – o que inclui forças nucleares – como prioridade militar. No mês passado, a China também exibiu seu arsenal de mísseis com capacidade nuclear em um desfile militar que foi acompanhado a distância pelo governo Trump.
O coronel da reserva e analista militar Paulo Roberto da Silva Gomes Filho, colunista da Gazeta do Povo, lembra que, “além dos movimentos russos e americanos, há fotografias de satélite que sugerem que a China estaria preparando instalações para testes nucleares subterrâneos. Os chineses também fizeram questão de mostrar todo o seu poderio bélico, inclusive com as armas da chamada tríade nuclear”, no desfile militar de 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial.
Nesta quinta-feira, um dia depois do anúncio, o presidente dos Estados Unidos acrescentou que a retomada imediata de testes nucleares está focada em conseguir a “desnuclearização” e incluir a China nas negociações dos tratados de não proliferação com a Rússia, algo que Pequim vem evitando nos últimos anos, segundo o governo americano, apesar de ser signatária do Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares. Estados Unidos e China não chegaram a ratificar tal acordo.
“Eu gostaria de ver a desnuclearização, porque temos muitas (armas nucleares) e a Rússia sofreu. A Rússia é a segunda e a China a terceira, e a China vai avançar em quatro ou cinco anos. Acho que a desescalada, o que eu chamaria de desnuclearização, seria uma grande coisa. Algo sobre o qual estamos falando com a Rússia e queremos adicionar a China”, declarou Trump no avião presidencial americano, de volta da Coreia do Sul, onde se reuniu com o ditador Xi Jinping.
De acordo com Lyle Morris, especialista em assuntos militares do Asia Society Policy Institute, o anúncio do republicano parece ter sido usado estrategicamente antes da reunião com Xi, provocando um “choque” nas autoridades chinesas, incluindo no ditador.
“Xi e a China não gostam de surpresas antes de uma grande cúpula. Isso cria uma distração que os chineses certamente não previram”, apontou Morris em entrevista ao Washington Post.
A Rússia, por sua vez, ameaçou abandonar a moratória sobre testes nucleares se outras potências fizerem o mesmo. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, aparentemente desprevenidos com as declarações de Trump, afirmou que Putin mantém o acordo e a Rússia não realiza testes nucleares desde a queda da União Soviética.
Contudo, segundo pontua Paulo Filho, Trump vinculou o reinício dos testes nucleares ao fato de outros países estarem caminhando nesse sentido. É o caso de Moscou.
“De fato, a Rússia testou recentemente um novo míssil, o 9M730 Burevestnik, capaz de conduzir ogivas nucleares, e um novo tipo de torpedo nuclear, que recebeu o nome de Poseidon, teoricamente capaz de destruir grandes áreas costeiras”, lembrou o analista militar.
Paulo Filho afirmou que esses testes não vinham sendo realizados há décadas, em razão dos tratados de não proliferação nuclear, paulatinamente estabelecidos ao longo da Guerra Fria. Agora, segundo ele, esses regimes estão sob forte pressão, o que deve ser encarado como algo “preocupante”, visto que o mundo observa um aumento significativo das tensões geopolíticas entre as grandes potências.
O tratado de não proliferação entre Estados Unidos e Rússia, o New START, vence em 4 de fevereiro e não há um caminho claro para renová-lo ou substituí-lo. Moscou deixou os compromissos de verificação e monitoramento em 2023 e, desde então, disse que se regerá pelos requisitos do acordo de forma voluntária, desde que os Estados Unidos também o faça.
Ao que parece, preliminarmente, o presidente Donald Trump está ampliando sua demonstração de força bélica e conduzindo Rússia e China a um novo campo de negociação que não era esperado por esses países de imediato. Por enquanto, o anúncio do americano foi recebido com preocupação, visto que pode abrir uma nova era de escalada nuclear no mundo.
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