Numa ofensiva de alto risco diplomático, institucional e econômico, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) intensificaram articulações junto ao Congresso e ao Palácio do Planalto nos últimos dias para criar mecanismos legais que aliviem ou anulem sanções estrangeiras contra autoridades do país. A medida visa blindar alvos da lei americana Magnitsky.
Em paralelo, magistrados apostam na intervenção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) junto ao presidente Donald Trump. Na conversa entre os líderes, em preparação pela diplomacia, Lula promete pedir a suspensão da aplicação da Magnistsky contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF, e sua esposa, a advogada Viviane Barsi, alvos de duras sanções financeiras.
A iniciativa, liderada pelo ministro Gilmar Mendes, do STF, mira a criação de uma lei que ele prefere chamar de “antiembargo”. A proposta avançou logo após as sanções contra Viviane Barsi. A Magnitsky bloqueia bens e negócios de sancionados nos Estados Unidos, além de proibir sua entrada naquele país, atingindo não apenas indivíduos, mas seus vínculos financeiros locais e internacionais.
Gilmar Mendes defende criação de órgão para conter efeitos imediatos de sanções
Em evento recente em Brasília, Gilmar Mendes defendeu publicamente que o Congresso aprove uma lei que impeça a execução automática de sanções estrangeiras. A proposta criaria uma instância nacional de análise, retardando efeitos imediatos contra autoridades e instituições brasileiras. O argumento central está na preservação de soberania e segurança jurídica.
O modelo em debate prevê a formação de colegiado reunindo Executivo, Legislativo, Judiciário, Advocacia-Geral da União (AGU) e Procuradoria-Geral da República (PGR). Esse órgão teria a palavra final sobre o reconhecimento ou não de medidas impostas por governos estrangeiros, funcionando como filtro político-jurídico para barrar impactos sobre empresas nacionais.
A ofensiva americana já abriu crise diplomática sem precedentes. O embate atingiu diretamente o STF, que figura como foco das sanções. Analistas e investidores reagem com apreensão, apontando que o Brasil pode ser acusado de afrontar normas dos Estados Unidos. Para eles, a blindagem proposta sugere uma lei feita sob medida para os magistrados.
Especialistas apontam ilegalidade da proposta contra a Magnitsky e risco de mais sanções
Mesmo após seguidas medidas de Washington, como cancelamento de vistos de diversas autoridades e os seus familiares, o STF manteve práticas vistas pela oposição e pela Casa Branca como abusivas, ilegais e violadoras de direitos. A mais recente foi contra o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), hoje nos Estados Unidos e acusado de conspirar contra o Brasil.
Para o advogado Jeffrey Chiquini, que atua na defesa de réus do 8 de janeiro, a fala de Gilmar Mendes foi gravíssima e flerta com o caos no país. Ele alertou que um juiz não pode propor medidas legislativas e que, ao citar experiências europeias de embargo contra Cuba e Irã, o ministro colocou o Brasil na mesma prateleira de países párias no cenário internacional.
Chiquini advertiu ainda que tentar blindar Moraes pode atrair “sanções secundárias” da Magnitsky. Isso incluiria a suspensão de serviços digitais, aplicativos e até bloqueio de páginas do STF hospedadas em servidores americanos. “A lei não se aplica ao Brasil, mas a quem negocia com os Estados Unidos. Ignorar isso é condenar empresas ao isolamento”, disse.
Para Daniel Afonso Silva, professor de Relações Internacionais da USP, a eventual aprovação de uma lei para sustar efeitos da Lei Magnitsky corre o risco de parecer apenas mera provocação, sem produzir nenhum efeito prático. “Tudo indica que as sanções continuarão de pé, independentemente de qualquer iniciativa do Judiciário ou do Legislativo”, resumiu.
Juristas aponta anistia disfarçada no projeto para proteger magistrados
O jurista André Marsiglia também criticou a iniciativa, acusando Gilmar Mendes de “acionar tropas do Congresso contra os Estados Unidos”. Para ele, o ministro fala em “neocolonialismo digital” americano, mas ignora que o Brasil vive, desde 2019, sob o “colonialismo judicial” do inquérito das Fake News, interpretado por críticos como fonte inicial de persistente juristocracia.
Marsiglia frisou que é impossível derrubar os efeitos da Magnitsky com uma lei nacional. “A legislação americana não atinge diretamente o Brasil. Obrigar bancos e outras companhias daqui a descumprirem normas dos Estados Unidos seria levá-las ao suicídio”, pontuou.
Além de tentar blindar casos futuros, a proposta prevê cláusulas de perdão retroativo, o que abrangeria Alexandre Moraes, sua esposa e outros alvos potenciais. Para os críticos, a manobra é uma “anistia disfarçada”, que enfraquece ainda mais a credibilidade do país e do STF, ao transformar blindagem a magistrados em uma política de Estado.
Proposta se inspira em precedentes internacionais e assusta mercado
A iniciativa recorre a exemplos da União Europeia (UE), que criou mecanismos contra sanções unilaterais, mas com eficácia limitada. No Brasil, encontra paralelo em decisões de ministros do STF, como Flávio Dino, que já condicionou o cumprimento de sentenças externas à chancela do Judiciário, num movimento de resistência que já derrubou os mercados.
Gilmar Mendes sustenta que a globalização financeira não pode deixar autoridades vulneráveis a normas estrangeiras. A oposição rebate, acusando-o de articular lei sob medida para Moraes. Parlamentares alertam que o país pode se isolar ainda mais se confrontar diretamente sanções americanas, em momento de fragilidade fiscal e crise institucional.
No mercado financeiro, a reação à “lei antiembargo” foi imediata. Bancos e multinacionais temem represálias se descumprirem determinações externas. Em agosto, após rumores de blindagem, ações de bancos brasileiros em bolsa registraram forte queda.
Experiência europeia mostra limites da blindagem proposta por Gilmar Mendes
Especialistas destacam que, na Europa, companhias preferiram seguir regras dos Estados Unidos para não perder acesso ao mercado americano. Decisões judiciais reforçaram esse alinhamento, mostrando que legislações nacionais pouco conseguem contra o alcance das sanções da Magnitsky. O mesmo risco se aplica ao Brasil, caso insista em desafiar Washington.
O episódio reforça a narrativa oposicionista de que o STF age em causa própria, em detrimento da estabilidade nacional. O desafio para os defensores da lei “pró-Moraes” será calibrar o discurso de soberania com garantias de segurança jurídica. Se a lei for interpretada apenas como autoproteção de ministros, a crise institucional tende a se aprofundar mais.
No Congresso, interlocutores do Palácio do Planalto tentam costurar texto que seja politicamente viável. A estratégia da liderança do PT na Câmara é evitar o rótulo de “lei pró-Moraes” e embalar a proposta em tom nacionalista. O governo aposta no Centrão, oferecendo salvaguardas às empresas, para evitar que o projeto seja derrotado no início da tramitação.
Projeto contra a Magnitsky pode ser protocolado neste ano com discurso nacionalista
A minuta do projeto já circula entre STF, AGU e Palácio do Planalto. A expectativa é apresentar o texto oficial até o fim do ano, antes que novas sanções sejam impostas. A pressa revela a preocupação de ministros do STF com a escalada de medidas americanas e a tentativa de antecipar a blindagem política e jurídica para evitar novos abalos à imagem da Corte.
Em evento da Lide, em Brasília, Gilmar Mendes afirmou que o STF superou o chamado “complexo de vira-lata”, ao receber reconhecimento internacional por sua “atuação pela democracia”. Para críticos, no entanto, a fala expõe contradição: busca prestígio global enquanto desafia a maior potência econômica do mundo.
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